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30/08/2012 - 09h32

Em Angola, marqueteiro do PT busca reeleger líder há 33 anos no poder

DA BBC BRASIL

Numa movimentada avenida de Luanda, capital de Angola, um brasileiro segura o trânsito para que um trio elétrico ilustrado com fotos do dirigente angolano, José Eduardo dos Santos, possa manobrar.

A poucos metros dali, outro brasileiro, braços tatuados e barba por fazer, dá instruções a três jovens angolanos que tocam violão sentados numa praça: "Atenção, pessoal, já vamos começar a gravar!"

BBC Brasil
Equipe de João Santana, marqueteiro do PT, produz campanha de José Eduardo dos Santos em Angola
Equipe de João Santana, marqueteiro do PT, produz campanha de José Eduardo dos Santos em Angola

Outros três brasileiros acionam as câmeras no instante em que o trio elétrico passa por baixo de um outdoor de Dos Santos, no poder desde 1979 e que nesta sexta-feira concorrerá às eleições para um novo mandato de cinco anos. Enquanto os jovens cantam uma música que venera o líder, ao fundo quatro retratos do presidente compõem o cenário.

Os responsáveis pela gravação, presenciada pela BBC Brasil na última segunda-feira, integram a numerosa equipe que o publicitário João Santana montou para produzir a campanha eleitoral do MPLA (Movimento Popular para a Libertação de Angola), partido que governa o país rico em petróleo no sudoeste africano desde sua independência, em 1975.

Principal marqueteiro do PT --comandou as últimas campanhas de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff à Presidência, além de assessorá-los em seus governos--, Santana tem internacionalizado sua atuação nos últimos anos.

Ele está à frente da campanha para a reeleição do presidente Hugo Chávez na Venezuela e atuou nas últimas disputas presidenciais em El Salvador e na República Dominicana --venceu ambas.

No Brasil, atualmente chefia outras duas campanhas: as dos petistas Fernando Haddad e Patrus Ananias às prefeituras de São Paulo e Belo Horizonte, respectivamente.

Em Angola, o marqueteiro participa da terceira eleição da história do país. A disputa será entre nove partidos, que montaram listas fechadas de candidatos. O primeiro da lista do partido mais votado se tornará presidente, e a proporção dos votos determinará a composição da Assembleia Nacional.

Cabeça de lista do MPLA, Dos Santos terá a chance de ser eleito pela primeira vez, já que no único pleito presidencial prévio, em 1992, a disputa foi suspensa antes da conclusão. Ele disputaria o segundo turno com o então líder da Unita (União Nacional para a Independência Total de Angola), Jonas Savimbi.

No entanto, a retomada da guerra civil às vésperas da votação suspendeu o processo e arrastou o conflito até 2002, quando Savimbi morreu e as duas siglas assinaram a paz.

LONGA PREPARAÇÃO

Embora a propaganda política obrigatória nas rádios e TVs só tenha começado em 31 de julho, boa parte da equipe brasileira está em Angola desde fevereiro.

Nos últimos meses, com a chegada de reforços para a reta final da campanha, o grupo passou a somar em torno de 120 pessoas (dos quais cerca de 75 brasileiros), segundo estimativa de integrantes angolanos.

Como na equipe que filmava o trio elétrico em Luanda, os brasileiros executam todas as funções que exigem maior perícia técnica: comandam as câmeras, conduzem os cinegrafistas sobre trilhos, editam e finalizam os vídeos, dirigem os atores angolanos e redigem os textos lidos por eles. Mas não aparecem em momento algum nos programas.

A orientação é camuflar ao máximo a presença brasileira --caso exposta, ela poderia alimentar críticas de que o governo privilegia trabalhadores estrangeiros, tema bastante sensível no país. Todas as várias tentativas da BBC Brasil de contatar a chefia da campanha foram rechaçadas.

Pessoas próximas à cúpula do MPLA calculam que a propaganda custou cerca de US$ 75 milhões, valor elevado inclusive para uma disputa presidencial no Brasil, país de dimensões continentais e com população dez vezes maior que a angolana (o PT declarou ter gasto a mesma quantia na campanha de Dilma em 2010).

O preço estimado da campanha em Angola soa ainda mais alto se considerado que o programa do MPLA ocupa somente cinco minutos na TV e dez minutos no rádio por dia --os outros oito partidos concorrentes têm direito a tempo igual.

Ainda assim, a legislação angolana não impõe limites aos gastos dos partidos e os exime de revelar a quantia arrecadada e seus doadores. Somente repasses de órgãos públicos, governos e ONGs estrangeiras são vedados.

HOSPEDAGEM

Durante os quase seis meses de produção, os brasileiros chefiados por Santana se hospedaram em dois dos hotéis mais caros de Luanda --o cinco estrelas HCTA (diária de US$ 575 para quartos individuais) e o Alvalade (US$ 407).

Nas viagens pelo interior do país, a equipe usou aviões. Vinhetas, jingles, cenas de obras e retratos de angolanos ocupam a maior parte dos programas, que contam ainda com fotografias tiradas pelo premiado fotógrafo Juca Varella, ex-editor de "O Estado de S.Paulo".

Apesar da tentativa de camuflar a presença brasileira, a campanha reciclou alguns programas do PT. No plano de governo do MPLA, o projeto de estímulo ao empreendedorismo foi batizado de "Meu Negócio, Minha Vida" --referência ao "Minha Casa, Minha Vida" dos governos Lula e Dilma.

Há ainda menção a um programa nos moldes do Bolsa Família, que prevê pagamentos a famílias pobres desde que elas cumpram contrapartidas.

A opulência da campanha do MPLA contrasta com a fraca publicidade dos outros partidos, que contaram cada um com financiamento público de US$ 700 mil para as eleições.

Em programas televisivos simples, seus candidatos fazem promessas e atacam o longo mandato do chefe de Estado angolano. Na África, esse mandato só é menor do que o do líder da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang Nguema, que chegou ao poder um mês antes que o angolano.

Os oposicionistas também afirmam que os órgãos de comunicação estatais angolanos - que no país têm peso muito maior que os meios privados - desequilibram a campanha ao apoiar abertamente o MPLA.

Único diário de alcance nacional, o "Jornal de Angola" estampou na terça-feira grande foto do candidato do MPLA com a seguinte legenda: "no coração do povo já é presidente".

A diferença na exposição dos vários candidatos também é gritante nas ruas de Luanda. Pôsteres, bandeiras do MPLA e outdoors de Dos Santos (com o slogan "Angola a crescer mais e distribuir melhor", cunhado por Santana) espalham-se por toda a cidade e quase escondem a publicidade das demais siglas.

No centro da capital, os sinais da oposição basicamente se resumem a algumas bandeiras da Unita e a cartazes da Casa-CE (Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral).

Não é a primeira vez que brasileiros comandam a campanha do MPLA. Nas eleições de 1992, o jornalista Ricardo Noblat chefiou a propaganda do partido, a cargo da agência baiana Propeg. Em 2008, a tarefa coube ao jornalista da TV Globo Carlos Monforte, também à frente de uma equipe da Propeg.

Pessoas próximas à cúpula do MPLA atribuem a contratação de Santana a uma indicação do ex-presidente Lula, que esteve em Angola em julho de 2011. Na ocasião, ele foi recebido pelo presidente angolano e visitou obras de empreiteiras brasileiras.

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