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Venezuela reduz desigualdade, mas sofre com escalada da violência
ABRAHAM ZAMORANO
DA BBC MUNDO, EM CARACAS
Ele gosta de ser chamado de Kevin. Tem 25 anos, mora em um subúrbio de Caracas, se autodenomina bandido e considera natural roubar e matar. "Isto é uma guerra de poder. É preciso se fazer respeitar. Se alguém faz algo louco, [como] um massacre, mata dois ou três com tiros na cara, o outro vê como exemplo e quer fazer algo pior", diz ele.
Kevin já não vive no bairro onde cresceu porque "ficou perigoso demais". "Havia gangues que matavam gente inocente, e nós começamos a nos defender. Por isso você se mete em problema: ou morre, ou mata."
O jovem é um dos muitíssimos venezuelanos que interiorizaram uma situação que mais se assemelha a um filme do velho oeste. Mas não se considera um dos "maus que gostam de matar inocentes".
Parte de uma família desestruturada, educado em áreas urbanas em que reinam as drogas e faltam condições de moradia, Kevin vive sob a certeza de que por muito tempo seus atos permanecerão impunes, apenas engordando as estatísticas que colocam a Venezuela entre os países mais perigosos da América Latina.
Não é à toa, portanto, que a insegurança seja um dos temas-chave da campanha eleitoral para o pleito presidencial que será disputado no próximo domingo, quando o presidente Hugo Chávez enfrentará nas urnas o opositor Henrique Capriles.
PROBLEMA
A Venezuela está mais perigosa e, ao mesmo tempo, menos desigual. Um recente estudo do braço de moradia das Nações Unidas apontou que o país tem a menor desigualdade de renda na América Latina. Sendo assim, o caso venezuelano parece mostrar que a origem da violência não é necessariamente a pobreza; ou, ao menos, que o fenômeno é muito mais complexo.
Não há estatísticas oficiais sobre violência nos últimos sete anos. A cifra mais recente é do ministro de Interior e Justiça, Tareck el Aissami, que falou em 48 homicídios a cada 100 mil habitantes em 2010. Mas o número é menor do que o fornecido pela ONG Observatório Venezuelano da Violência, que calcula que haja 57 homicídios para cada 100 mil pessoas no mesmo ano.
Chávez já admitiu que o problema é "grave" e reagiu com a criação do plano "Grande missão para toda a vida", prometendo prevenção, investimentos em forças de segurança e reforma judicial.
O presidente afirma que, nos seus 14 anos no poder, seu governo tem combatido a criminalidade por meio de programas de redução da pobreza. Mas reconheceu que "a Venezuela é um exemplo de que não bastam políticas sociais para reduzir os índices de violência criminal."
Mas afirma que o maior crescimento da criminalidade ocorreu na década de 90, "por culpa de políticas neoliberais".
DESIGUALDADE
Segundo a ONU, o índice de Gini (que mede a desigualdade) da Venezuela é de 0,41, o melhor da América Latina (quanto mais próximo de 1, maior a desigualdade). A taxa de pobreza urbana no país passou de 49% em 1999 para 29% em 2010. A taxa é um pouco menor que a do México (32%), país que, mesmo em plena "guerra contra o narcotráfico", registra uma taxa de homicídios muito menor, estimada em 18 a cada 100 mil habitantes.
Para Roberto Briceño, responsável pelo Observatório Venezuelano da Violência, a situação é "trágica".
"[A Venezuela] É o único país que, em 12 anos, triplicou a taxa de homicídios, sem haver guerras ou eventos 'espetaculares'. É trágico pela falta de resposta das autoridades e a falta de proteção aos cidadãos", afirmou, alegando que, no mesmo período, cidades como São Paulo e metrópoles colombianas reduziram suas taxas de homicídio.
Briceño afirma que, "ao considerar que a violência e o crime têm sua origem na pobreza e no capitalismo", o governo optou por "não se mostrar como repressivo" à criminalidade.
"A noção de que diminuir a pobreza reduzirá a violência é falsa, a explicação não está na desigualdade", opina. "A explicação está na institucionalidade, nas regras do jogo que regem a sociedade."
O "nível" de impunidade também contribui para esse cenário, diz ele. "Em 1998, para cada cem homicídios, houve 118 detenções. Em 2011, esse número caiu para nove. Isso quer dizer que a impunidade é total -em 91% dos casos, sendo otimista. Não há processos nem condenações. Não há motivos para não delinquir na Venezuela."
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