Alexandre Schwartsman

Consultor, ex-diretor do Banco Central (2003-2006). É doutor pela Universidade da Califórnia em Berkeley.

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Alexandre Schwartsman
Descrição de chapéu Donald Trump estados unidos

Sobretaxa ao aço mostra fragilidades da recuperação da economia global

Quando os EUA adotam políticas semelhantes às patrocinadas pela Nova Matriz, devemos nos preocupar

O presidente dos EUA, Donald Trump, durante anúncio sobre implementação de tarifas à importação de aço e alumínio
O presidente dos EUA, Donald Trump, durante anúncio sobre implementação de tarifas à importação de aço e alumínio - Kevin Lamarque - 1º.mar.18/Reuters

Há pelo menos duas ordens de desenvolvimento negativo originárias da decisão de Donald Trump de elevar as tarifas de importação de aço e alumínio, com o objetivo declarado de proteger esses setores da concorrência internacional.

A primeira diz respeito aos efeitos sobre a própria economia americana. Apesar de quase 150 anos de pesquisa econômica sobre o comércio internacional, ainda há quem acredite nos benefícios do protecionismo, em geral apelando para possíveis impactos positivos sobre o emprego nos setores beneficiados (muito embora os espertalhões saibam muito bem que o efeito maior é sobre a distribuição de renda em favor de quem obteve a proteção requerida).

Ainda que medidas protecionistas possam beneficiar o setor privilegiado, não há dúvida de que fazem estragos ainda maiores no restante da economia. A começar porque elevam os preços para consumidores, na prática transferindo renda a favor do setor protegido. Não se trata, porém, de um ganho de soma zero, mas sim de soma negativa.

De fato, além da redistribuição de renda, há também a redistribuição de recursos, de setores mais produtivos (os que prevaleciam antes da intervenção) para os menos produtivos (os agora protegidos). O resultado é redução da produtividade e, portanto, da renda da economia como um todo.

Esse efeito não é pequeno: meus ex-professores Jeff Frankel e David Romer, em artigo clássico, estimaram que cada ponto percentual a mais de abertura comercial (a soma de exportações e importações sobre o PIB) eleva a renda per capita em pelo menos meio ponto percentual.

No caso americano, em particular, dado que a economia opera praticamente em pleno emprego, não há muito a ganhar em termos de postos de trabalho. Por outro lado, esse tipo de medida aumenta (marginalmente, é verdade) as chances de elevações adicionais de taxas de juros, já que pode pressionar salários.

Esses são, no entanto, danos autoinfligidos e, à parte o efeito sobre as taxas de juros, com repercussões limitadas para a economia global (obviamente maiores para os que exportam aço e alumínio para os EUA, entre eles o Brasil).

A outra ordem de problemas, potencialmente mais danosa, diz respeito às reações à iniciativa americana  —no caso, a possibilidade de uma guerra comercial, expressa na elevação retaliatória de tarifas (ou outras barreiras ao comércio) por parte dos países diretamente afetados pelas medidas protecionistas.

Não é demais lembrar que, entre os efeitos que ajudaram a transformar a Crise de 29 na Grande Depressão, figuram em lugar de honra as medidas de restrição ao comércio internacional (note-se que aqui não falamos de desvalorização da moeda, mas tarifas e outras barreiras).

Obviamente, elevar tarifas em retaliação também é danoso para quem o faz, mas, do ponto de vista de um jogo de várias rodadas, pode ser exatamente o requerido para convencer os demais de sua firmeza de propósito e induzi-los a reverter as medidas iniciais.

De qualquer forma, apesar da visível recuperação da economia global nos últimos anos, há fragilidades, principalmente no que diz respeito ao campo político. Ninguém precisa balançar o barco.

Quando a principal economia do mundo adota políticas semelhantes às patrocinadas pela Nova Matriz no Brasil, devemos ficar muito preocupados.

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