Alexandre Vidal Porto

Escritor e diplomata, mestre em direito (Harvard). Serviu na missão na ONU e no Chile, EUA, México e Japão. É autor de "Sergio Y. vai à América" (Cia das Letras).

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A Rio 2016 deixa legado de respeito às minorias sexuais

No livro "Sexo em números": o que a estatística revela sobre o comportamento sexual (Sex by Numbers: what statistics can tell us about sexual behavior, Profile Books), publicado na Inglaterra, no ano passado, o estatístico britânico sir David Spiegelhalter confirma que cerca de 10% da população mundial é lésbica, gay, bissexual ou transgênero (LGBT).

No entanto, na Rio 2016, apenas 53, ou 0,5% dos atletas, assumiram ser LGBT. Se 2% assumissem, por exemplo, seriam 230 atletas. Essa diferença entre estatística e realidade permanece no armário.

Mas isso tende a mudar.

A cada Jogos Olímpicos, o número de atletas abertamente LGBT mais que dobra. Em Pequim 2008, eram 10. Em Londres 2012, passaram a 23. Na Rio 2016, foram 53. A seguir-se esse ritmo, teremos mais de uma centena em Tóquio 2020.

Assumir uma orientação sexual diversa publicamente nem sempre é fácil ou possível. Mas a coragem para fazê-lo parece render frutos desportivos: 47% dos atletas abertamente LGBT na Rio 2016 subiram ao pódio.

A homofobia não poupa o ambiente esportivo, e os atletas estão expostos a ela cotidianamente (pense no futebolista gay sendo chamado de "bicha" pela torcida). Contudo, a elite desportiva mundial -e seus fãs- parecem estar absorvendo rapidamente a ideia de que alguns de seus ídolos são LGBT —e de que isso não faz qualquer diferença.

Na Rio 2016, atletas homossexuais mostraram-se publicamente aos olhos da imprensa e da opinião pública. Normal. Ninguém ligou. Nem parecia o país que fez aquele fuzuê todo por causa do beijinho gay do Mateus Solano e do Thiago Fragoso na novela.

Essa visibilidade pública dos atletas LGBT durante a Rio 2016 deixa um legado importante para a construção da justiça social no Brasil. Foi alentador ver uma judoca lésbica dar a primeira medalha de ouro para um país tão necessitado de vitórias. E deu orgulho ter a intimidade doméstica de um casal de jogadoras de vôlei de praia brasileiras exibida de forma prosaica no horário nobre da cadeia norte-americana NBC.

Na Rio 2016, o orgulho nacional apropriou-se das minorias sexuais. A ideia de tolerância estava presente já na cerimônia de abertura, na qual transgêneros, entre eles a modelo Lea T., conduziram a entrada das equipes.

Acentuou-se com a forte reação negativa ao jornalista do Daily Beast que fez matérias expondo atletas LGBT. E consolidou-se com a quantidade de beijos, celebrações e propostas de casamento nos quais os atletas LGBT estiveram publicamente envolvidos durante os jogos.

A mensagem de tolerância e respeito às minorias sexuais durante a Rio 2016 pegou bem para o Brasil e foi destacada na imprensa internacional. A cobertura confirmou o Brasil entre os países nos quais a aceitação da homossexualidade encontra problemas pontuais, mas é uma realidade irreversível.

Os Jogos Olímpicos acabaram, e o Brasil voltará a ser um dos países mais violentos do mundo contra LGBTs. Essa é a realidade contra a qual devemos lutar, tendo em mente que, na luta contra a discriminação e o ódio, temos campeões olímpicos no nosso time. Isso não é pouco. A Tóquio 2020!

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