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benjamin steinbruch

 

29/01/2013 - 03h00

Sentimento

Diante da tragédia de Santa Maria, onde tantos estudantes foram tristemente vitimados, quase desisti de escrever este artigo que havia programado sobre educação. Mas convenci-me de que a história de Jonilda Alves Ferreira, narrada pelo repórter Carlos Rydlewski, da revista "Época Negócios", é uma daquelas que merecem ser recontadas.

Ela é professora de matemática, tem 44 anos e vive na pequena cidade de Paulista, de 12 mil habitantes, no sertão da Paraíba, a 397 quilômetros de João Pessoa. Dá aulas num colégio público, a Escola Municipal Cândido de Assis Queiroga, para seis turmas, do 6º ao 9º ano.

Até aí, tudo normal. Ocorre que, no ano passado, os alunos do município participaram com grande destaque da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas. Competindo com 19 milhões de alunos de escolas públicas em todo o país, esses jovens de Paulista conquistaram 22 prêmios, sendo 5 medalhas de ouro, 2 de prata, 3 de bronze e 12 menções honrosas.

O que estaria acontecendo no ensino público dessa cidade no meio do sertão nordestino? Essa curiosidade levou à descoberta de Jonilda.

Ela é a professora que despertou entre os alunos da cidade uma espécie de febre por números. Além de competente na matéria que ensina, ela é dedicada, trata os alunos de forma afetiva e faz com que eles não tenham vergonha de explicitar suas dúvidas. Talvez por intuição, adota técnicas modernas de ensinar matemática na prática. A aula sobre frações, por exemplo, pode ser numa pizzaria, onde ela mostra as fatias para explicar o significado de um oitavo ou um quarto.

Quais as lições que Jonilda manda da Paraíba para a educação brasileira? Várias, mas uma delas certamente é a de que o professor preparado e motivado continua sendo um fator determinante para o estímulo à formação dos jovens.

Mesmo em tempos de abundante fluxo de informação e fácil acesso ao conhecimento, por meio da internet, a figura do bom professor permanece sendo indispensável.

Há um enorme descaso com os professores no país. Quem tem mais de 50 anos e já morou no interior certamente se lembra do status que tinha a figura do professor. Bem remunerado e bem formado, ele era tratado com respeito e admiração por pais e alunos. E os melhores lecionavam nas escolas públicas.

No antigo ginásio estadual, só se entrava depois de passar por um exame de admissão. Quem fosse reprovado, com nota inferior a 5, tinha de se contentar em cursar uma escola particular.

Outra lição de Jonilda é sobre dedicação. Ela procura manter os alunos ocupados com matemática o maior tempo possível, na escola ou fora dela. Isso nos lembra que ampliar a jornada escolar é uma necessidade básica para consertar a educação brasileira. No Brasil, os alunos ficam na escola três a quatro horas -os pais nem têm onde deixar os filhos enquanto trabalham suas oito horas diárias. Na Coreia, que fez uma revolução educacional em quatro décadas, há jornada de 12 horas. Em toda a Europa, os alunos frequentam a escola em tempo integral, padrão para quase todos os países desenvolvidos e emergentes, como China e Índia.

Outra lição é que as autoridades estaduais e municipais, por mais escassos que sejam seus recursos, não podem se omitir na tarefa educacional, achando que a responsabilidade cabe apenas ao governo federal. Em Paulista, apesar dos parcos recursos, a escola pública é mais desejada do que a privada, não por só ser gratuita, mas por ser melhor e formar campeões em matemática.

O ensino básico está quase universalizado no país e praticamente não há analfabetos em idade escolar. Mas existem ainda milhões de analfabetos funcionais, pessoas de todas as idades que passaram por escolhas públicas, aprenderam a soletrar e a escrever o nome, mas não conseguem compreender um texto de baixa complexidade.

Mais do que tudo, com sua febre por números, a professora Jonilda nos faz lembrar que só há um caminho para modificar a realidade educacional no país: melhorar a qualidade da escola pública, principalmente no ensino fundamental.

Para isso, faltam recursos e são bem-vindas as receitas dos novos contratos do pré-sal para a educação. Mas essa tarefa não depende apenas de verbas. Exige também gestão, dedicação e obstinação.

P.S. Santa Maria, meus sentimentos sinceros. Santa Maria, cidade de meu pai.

benjamin steinbruch

Benjamin Steinbruch é empresário, diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração e 1º vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Escreve às terças, a cada duas semanas.

 

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