Jornalista, assina a coluna Brasília. Na Folha, foi correspondente em Londres e editor interino do 'Painel'.
Uma reforma para pior
BRASÍLIA - Os eleitores que gastaram saliva pedindo uma reforma política correm sério risco de se arrepender nesta semana. A Câmara votará um conjunto de propostas que ameaça agravar, em vez de consertar, os problemas do sistema atual.
As manifestações de 2013 expressaram o anseio por mais participação, mais representação e mais transparência. A reforma que vem aí acena com o contrário disso: menos participação, menos representação e menos transparência nas eleições.
Hoje o brasileiro vai às urnas a cada dois anos. O calendário se divide entre eleições gerais (para deputado estadual e federal, senador, governador e presidente) e eleições municipais (para vereador e prefeito). A proposta mais cotada na reforma institui uma só eleição a cada cinco anos. Quem acha que participa pouco participará menos ainda.
O grupo que manda na Câmara também quer mudar a forma como são eleitos os deputados. O único modelo com chance de ser aprovado é o afegão, aqui rebatizado de distritão. É um sistema que ignora o desempenho dos partidos, estimula o personalismo e reduz a representação das minorias no Congresso.
Por fim, está em jogo o financiamento das campanhas, origem de nove entre dez escândalos de corrupção. Ninguém esperava milagres, mas havia uma oportunidade de reduzir a influência do poder econômico nas eleições. O sistema deve permanecer como está, com uma mudança para pior. As doações irão apenas para os partidos, o que tende a deixar as prestações de conta ainda menos transparentes.
Para coroar o pacote, o presidente da Câmara jogou no lixo o trabalho da comissão que passou os últimos três meses discutindo a reforma. Como o resultado não o agradou, ele encerrou o grupo sem a votação do relatório. "Fizemos papel de bobo", desabafou o relator Marcelo Castro. Se a reforma de Eduardo Cunha for aprovada, a frase também valerá para os manifestantes de 2013.
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