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clóvis rossi

 

03/07/2012 - 03h00

Ecos do Brasil no voto mexicano

DE SÃO PAULO

Lembra-se do grito "O povo não é bobo/abaixo a Rede Globo", que marcava mobilizações populares nos anos 80, primeiro na campanha pelas "Diretas já" e depois na campanha presidencial de 1989?

Pois é, há ecos desse grito no México que votou domingo. O alvo principal é uma espécie de Globo mexicana, a Televisa, principal emissora mexicana, acusada de favorecer o candidato do PRI (Partido Revolucionário Institucional), Enrique Peña Nieto, que acabou sendo eleito, e de fazer uma campanha suja contra o candidato da esquerda, Andrés Manuel López Obrador.

Parece um eco das acusações de que a Globo beneficiou Fernando Collor de Mello e prejudicou Luiz Inácio Lula da Silva, em especial na edição do debate do segundo turno.
Um segundo eco: no Brasil, a garotada lançou o movimento batizado de "caras pintadas", para pressionar pelo impeachment de Collor, em 1992. No México, mudou o nome (para #YoSoy 132), mas não o objetivo: pressionar para evitar a eleição de Peña Nieto.

O nome surgiu depois de uma manifestação estudantil contra o candidato do PRI. A Televisa e a assessoria de Peña Nieto alegaram que os manifestantes não eram estudantes, mas infiltrados pela campanha de López Obrador. Em resposta, a estudantada gravou vídeo em que 131 deles exibiam suas carteiras de estudantes. Seguiu-se a adesão de muitos mais, que proclamavam ser, cada um deles, o 132.

O movimento acabou derrotado, já que Peña Nieto se elegeu, mas, mesmo assim, deixou sua marca: o candidato do PRI partiu com 48% das intenções de voto, quando a campanha começou em março, mas elegeu-se com apenas 38%. O PRI tampouco obteve a maioria absoluta das vagas nas duas Casas do Congresso.

Uma aliança, ainda que pontual, entre o partido de López Obrador e o conservador PAN (Partido de Ação Nacional, do atual presidente Felipe Calderón) pode embaçar tremendamente a agenda de reformas que Peña Nieto pretende levar adiante, como reiterou ontem, após ser dado como vencedor.

Talvez seja exagerado atribuir apenas ao movimento estudantil a queda de Peña Nieto, assim como seria temerário imaginar que os "caras pintadas" nas ruas derrubaram Collor.

De todo modo, as redes sociais se tornaram atores políticos relevantes. Nem tanto no Brasil, em que há escassa tradição de mobilização de massas. No México, ao contrário, #YoSoy132 obteve um certificado de relevância, ao organizar um debate com três dos quatro candidatos (Peña Nieto não foi), suplantando até os canais usuais (tevês, rádios e jornais).

No fundo, o movimento mexicano é parente próximo de grupos como os "indignados", ativo em especial na Espanha, ou o "Ocupe Wall Street".

Entre as muitas características desses grupos, está a de expor o esgotamento do papel dos partidos políticos como intermediários entre o Estado e sociedade.

Resta ver se ficam apenas em manifestações pontuais ou se conseguem atrair o público para uma ação política mais permanente e que não seja só contra alguma coisa ou alguém.

crossi@uol.com.br

clóvis rossi

Clóvis Rossi é repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha, ganhador dos prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. É autor de obras como 'Enviado Especial: 25 Anos ao Redor do Mundo' e 'O Que é Jornalismo'. Escreve às terças, quintas, sextas e domingos.

 

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