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clóvis rossi

 

25/10/2012 - 03h00

Brasil, adeus à ilusão

DE SÃO PAULO

A repórter Mariana Carneiro quase destruiu minhas já tênues ilusões de, antes de morrer, ver o Brasil ser realmente um grande país, em vez de um mero emergente.

Mariana capturou um estudo do HSBC que diz que, em 2050, o Brasil ainda será país de renda média, embora média alta, tal como já o é hoje.

Em 2050 (ou antes, mais provavelmente), já estarei morto.

É verdade que não levo muito a sério os oráculos, menos ainda os do setor financeiro. Se essa gente foi incapaz de enxergar nos primeiros meses de 2008 a crise que, em setembro, viraria tsunami, como se animam a dar a classificação do campeonato mundial de economia dentro de 38 anos?

Feita a ressalva, o estudo do HSBC tem o mérito de coincidir com uma nítida mudança de humor em torno dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), que se tornaram quase sinônimo de emergentes, aquele grupo de países que vão substituir as potências tradicionais dentro de uns quantos anos.

O estudo do banco, por si só, já traz números que convidam à cautela em relação ao real peso dos BRICS. Mesmo o maior e mais forte deles, a China, está muito longe, dos Estados Unidos --e continuará estando em 2050.

Terá, então, uma renda per capita (U$ 17.759) que é menos da metade da renda de cada norte-americano em 2010 (US$ 36.354).

Ou seja, a China vai continuar crescendo mais que os Estados Unidos mas, assim mesmo, levará 40 anos para chegar à metade do que cada norte-americano ganha hoje.

O caso do Brasil é ainda pior: sua renda per capita, em 2010, era superior à de todos os parceiros BRICS. Em 2050, será inferior à da Rússia e da China. Ou seja, o Brasil é um emergente que emerge menos que seus sócios na aventura.

Pulemos agora para artigo de Ruchir Sharma, chefe de Mercados Emergentes da Morgan Stanley, publicado pela "Foreign Affairs", com o significativo título "Broken BRiCS" (BRICS Quebrados, um exagero).

Sharma começa lembrando que nem remotamente se cumpriram as previsões dos anos 80 de que o Japão logo passaria a ser o número um do mundo, economicamente.

Quanto aos BRICS, "com a economia mundial caminhando para seu pior ano desde 2009, o crescimento chinês está desacelerando agudamente, de dois dígitos para 7% ou menos. E o resto dos BRICS está derrapando também: desde 2008, o crescimento anual do Brasil caiu de 4,5% para 2%: o da Rússia, de 7% para 3,5%; e o da Índia, de 9% para 6%".

Sharma é impiedoso: "A noção de uma abrangente convergência entre os mundos desenvolvido e em desenvolvimento é um mito".

Acrescenta: "Dos cerca de 180 países acompanhados pelo FMI, só 35 são desenvolvidos. O resto são emergentes - e muitos deles têm sido emergentes por muitas décadas e continuarão a sê-lo por muitas mais".

Reforça Antoine van Agtmael, autor do "Século dos Mercados Emergentes: "Assim como as economias em expansão [dos BRICS] surpreenderam o mundo na década passada, o grande choque para a próxima década pode ser que eles cresçam menos rapidamente do que se presumia".

Adeus, ilusões.

crossi@uol.com.br

clóvis rossi

Clóvis Rossi é repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha, ganhador dos prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. É autor de obras como 'Enviado Especial: 25 Anos ao Redor do Mundo' e 'O Que é Jornalismo'. Escreve às terças, quintas, sextas e domingos.

 

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