É fácil aplaudir o acordo entre o Irã e as grandes potências sobre a questão nuclear: basta imaginar a hipótese inversa, ou seja, o rompimento das negociações.
O Irã continuaria a desenvolver um programa que, no limite, o levaria a obter a bomba atômica. Por si só, já seria um pesadelo, em se considerando que se trata de uma ditadura teocrática, o que lhe dá um absurdo grau de imprevisibilidade.
Afinal, ninguém de fora pode adivinhar o que os deuses soprariam aos aiatolás que governam o país, por mais que estes jurem, seguidamente, que o Corão lhes proíbe dotar-se de armas nucleares.
O Ocidente não acredita, do que dá prova a afirmação do presidente americano, Barack Obama, mal fechado o acordo: o entendimento não se baseia em confiança, mas em inspeções.
A esse pesadelo, some-se o fato de que a Arábia Saudita, principal rival do Irã no Oriente Médio, ficaria tentada a também correr atrás da bomba, desatando uma corrida nuclear apocalíptica.
Israel, o inimigo principal do Irã, sentir-se-á tentado a conter pela força o programa nuclear iraniano.
Se o Oriente Médio já é o barril de pólvora conhecido, acrescentar todas essas turbulências, reais ou potenciais, é tudo o que o planeta dispensa.
É bom deixar claro que a desconfiança em relação ao Irã não desaparece de todo com o acordo, conforme antecipa o presidente Obama.
Mas é pouco crível que as seis principais potências do planeta sejam tão ingênuas ou despreparadas que assinaram um acordo que deixe brechas para o Irã alcançar a bomba.
O fato é que o Irã, colocado em quarentena pelas Nações Unidas há uma década aproximadamente, está de volta ao mundo, com o acordo.
De saída, espera a liberação de algo em torno de US$ 100 bilhões (R$ 314 bilhões) que estavam congelados pelo Ocidente, como parte das sanções impostas ao país.
Será um alívio razoável para uma economia tão abalada pelas sanções que forçaram os aiatolás a negociar.
O levantamento das demais sanções dará ainda mais vigor ao país, mas a dúvida é saber se os novos recursos serão usados para anabolizar uma economia combalida ou para apoiar aliados em guerra.
O Irã, mesmo de volta ao convívio global, não vai abandonar a Síria do ditador Bashar Assad, sitiado pelos radicais do Estado Islâmico e também pela oposição não radical.
Tampouco vai deixar de lado o Hizbollah, movimento xiita libanês, que luta ao lado de Assad e, de quebra, está em guerra eterna com Israel.
Tudo somado, está claro que o acordo dá ao Irã um novo status regional, conforme afirma Ray Takeyh, pesquisador-sênior para Estudos do Oriente Médio do Council on Foreign Relations:
"O acordo nuclear não só legitima o programa iraniano como também sinaliza para a região que os Estados Unidos veem o Irã como um poder cujas reivindicações tem que ser levadas em conta".
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