É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.
Semeando futuros 'Trumps' pela América Latina
Os governos latino-americanos estão se tornando uma ameaça para os negócios. Palavra do Fórum de Davos, o clube que organiza anualmente o maior convescote anual planetário de personalidades da política, da academia e, principalmente, do mundo empresarial.
Diz o relatório sobre riscos globais, elaborado a partir da opinião de 750 especialistas, na parte específica sobre América Latina: "Com base nos dados de nossa pesquisa executiva de opinião com líderes empresariais, identificamos o fracasso da governança nacional como o risco número um para fazer negócios na América Latina em 2017".
Mais: dos quatro riscos seguintes, três estão também associados à governança —e à má governança. Pela ordem: desemprego e subemprego; crise fiscal; e profunda instabilidade social. Só o quinto (o choque do preço da energia) independe dos governos e fica à mercê dos mercados.
A opinião dos homens de negócios, quase sempre determinante para a boa marcha da economia, coincide, nesse caso, com a do público em geral, em praticamente toda a América Latina.
É o que demonstram as pesquisas de opinião pública. Raríssimos governantes passam a barra dos 50% de aprovação. Na mais recente tabulação comparável, o presidente com maior índice de aprovação era o boliviano Evo Morales, que, no entanto, não conseguiu que o eleitorado aprovasse em plebiscito a possibilidade de uma nova candidatura.
Parêntesis: Evo está tentando uma gambiarra para driblar o resultado do plebiscito, mas, mesmo que o consiga, não terá nada a ver com popularidade. Não preciso dizer que o brasileiro Michel Temer e o venezuelano Nicolás Maduro são os de pior desempenho.
É verdade que Temer é herdeiro de um fracasso, o da gestão Dilma Rousseff. Mas não conseguiu até agora mudar minimamente um cenário devastador.
A desconfiança em relação aos governos remete inexoravelmente aos Estados Unidos e à eleição de um outsider como Donald Trump.
O respeitado Centro de Pesquisas Pew acaba de concluir uma avaliação dos méritos e deméritos da gestão Barack Obama, na qual informa: "Os americanos ficaram desiludidos com a maneira pela qual Washington respondeu ao derretimento financeiro de 2008. Em 2015, sete de cada dez americanos diziam que as políticas do governo em seguida à recessão em geral fizeram pouco ou nada para ajudar a classe média. Porcentagem praticamente igual dizia que tais políticas ou fizeram muito ou o necessário para ajudar grandes bancos e instituições financeiras".
Como se sabe, Trump montou sua estratégia na base de apresentar-se (falsamente) como antiestablishment. É razoável imaginar que, na América Latina, esse descontentamento com as elites dará margem
a algum Trump (ou vários)?
É cedo para dizer, mas, no Chile, um dos países que tem eleição este ano, está crescendo o senador Alejandro Guillier, do Partido Radical, "até agora o único candidato percebido como opção antiestablishment", como diz Maria Luisa Puig, da consultoria Eurasia Group. Levando em conta o rebuliço que a vitória de Trump está provocando convém prestar atenção a um eventual efeito contágio ao sul do rio Grande.
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