É repórter especial. Ganhou prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. Escreve às quintas e aos domingos.
Calote, embora parcial, é último prego no caixão da Venezuela
O fato de a Standard and Poor's, agência de avaliação de risco, ter nesta terça-feira (14) declarado a Venezuela em "default parcial" é apenas a mais recente demonstração do clamoroso fracasso de um regime. Fracasso que só a esquerda brasileira não vê, salvo uma ou outra exceção inteligente.
Vejamos os números do fracasso:
- Ao terminar 2017, o colapso econômico da Venezuela, que vem se acentuando desde 2012, tornar-se-á o mais profundo na história moderna da América Latina, jogando a renda per capita para o nível em que estava nos anos 50 do século passado. O chamado "socialismo do século 21" provocou, portanto, um retrocesso de mais de 60 anos. Nem países em guerra chegam a esse nível de degradação.
- Pesquisa das principais universidades mostra que 93% dos venezuelanos não têm renda suficiente para comprar os alimentos de que necessitam.
- Três de cada quatro venezuelanos perderam peso no ano que está terminando (9 quilos em média).
- O preço dos produtos básicos é cerca de 15 vezes o salário mínimo. Aliás, o valor do salário mínimo caiu para o equivalente a US$ 4,3 (R$ 14,10), conforme relatou Yan Boechat nesta Folha, na terça (14).
- A inflação deve fechar o ano na estratosférica altura de 1.000%, sempre segundo o competente Boechat.
- As farmácias não têm 85% dos medicamentos necessários, com carências desde simples analgésicos a produtos mais sofisticados, como as drogas para quimioterapia.
À margem da economia, há a criminalidade descontrolada que transformou a Venezuela em um dos pais com maior número de mortes violentas no mundo todo. Sem mencionar a violência institucional, representada pela paulatina transformação do regime em uma ditadura. Uma ditadura tão corrupta, aliás, que a revista "The Economist" chegou a batizar o socialismo bolivariano de "thugocracy" (governo de gângsteres).
Alguma chance de a declaração de "default", ainda que parcial, levar o governo a refletir e a tentar corrigir o rumo? Chance zero. O presidente Nicolás Maduro vive em uma bolha. Tanto que classificou a reunião de segunda-feira (13) com um grupo de credores como "sucesso retumbante". Já os credores deixaram claro que foi, na verdade, um fracasso retumbante —tanto que, no dia seguinte, a Standard and Poor's crava o "default parcial" (em português claro, calote parcial).
Vê-se, pois, que nem a visão da forca aclara a mente dos governantes da Venezuela —o que não chega a ser uma surpresa quando se sabe que Maduro jura que recebeu conselhos de seu mentor Hugo Chávez, por meio de um "pajarito".
Seria apenas ridículo, não fosse uma tragédia para a sociedade venezuelana.
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