Denise Fraga

É atriz e autora de "Travessuras de Mãe" (ed. Globo) e "Retrato Falado" (ed. Globo).

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Festival de variantes

Sempre achei que bola na trave deveria valer alguma coisa. É claro que deixei essa convicção de lado em nosso suado embate contra o Chile. Fiquei no sofá agradecendo a Deus não valer nenhum ponto a mais a bola no travessão que nos salvou. Mas convenhamos que é muito mais fácil acertar os quase 18 metros quadrados que compõem o espaço do gol do que a linha de 12 metros e 20 centímetros que o delimita. Ainda que com Júlio César no meio. Bola na trave é o erro mais difícil de acertar. Mesmo assim, nada vale. Porque é erro.

O ópio do povo cresce num campo cheio de ambiguidades e sutilezas. Como pode valer só bola na rede dentro da imensa riqueza de variantes de uma partida? Ser melhor não ganha o jogo. O futebol é injusto em si e multiplica juízes inflamados pelos bares, jornais e TV. Quem criou as regras do jogo soube bem criar-lhe a fama. Deixou brechas para dar o que falar até o próximo jogo, quando tudo começaria novamente. Só damos conta do poder da coisa quando nos surpreendemos aos berros com a nossa sogra delimitando o que é braço e o que é peito no torso escultural de nosso Hulk. São brigas permitidas que vêm há anos desafogando a humanidade.

Nenhuma se comparará ao tribunal Suárez da última semana. Ontem à noite, eu, já esquecida do assunto entre pessoas que eu mal conhecia, ao ouvir o nome dele, deixei escapar:

-Coitado! -Foi o suficiente para detonar tudo de novo.

-Coitado de quem levou a mordida!

Coitada da Fifa que precisa inventar regras pra algo tão móvel e tão rico como o futebol. Suárez mordeu, não foi expulso na hora e depois foi exageradamente crucificado, porque simplesmente não há senso capaz de lidar com tamanho festival de variantes. E, sem sutilezas, perdem-se riquezas. Perdemos Suárez.

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