Edgard Alves

Jornalista, participou da cobertura de sete Olimpíadas e quatro Pan-Americanos.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Edgard Alves

Brasil da Olimpíada de Inverno é aventura para abnegados

Crédito: David Gray - 19.fev.2014/Reuters Brazil's Isadora Williams competes during the Figure Skating Women's Short Program at the Sochi 2014 Winter Olympics, February 19, 2014. REUTERS/David Gray (RUSSIA - Tags: OLYMPICS SPORT FIGURE SKATING) ORG XMIT: OLYB015
A patinadora Isadora Williams durante prova disputada na Olimpíada de Inverno de 2014, em Sochi

Embora seja um país tropical, participar da Olimpíada de Inverno não é mais novidade para o Brasil. Os Jogos são disputados desde 1924. A estreia brasileira aconteceu na francesa Albertville, em 1992. Não parou mais. Esteve em todas as edições a partir de então.

Nessa breve história, porém, nenhum brasileiro chegou ao pódio. A snowboard Isabel Clark, que estará no evento pela quarta vez, foi protagonista do melhor resultado nacional: nono lugar em Turim-2006.

O COB (Comitê Olímpico do Brasil) divulgou curiosidades sobre as participações da equipe. Na última disputa, em Sochi-2014, compareceu com sua maior delegação, de 13 atletas em sete modalidades. Agora, em PyeongChang, de 9 a 25 do mês que vem, vai contar com nove atletas e mais um reserva, em cinco esportes.

Sem tradição nas modalidades de inverno, a equipe é formada por Isadora Williams (patinação artística); Edson Bindilatti, Odirlei Pessoni, Rafael Souza, Edson Martins e o reserva Erick Vianna (bobsled); Michel Macedo (esqui alpino); Jaqueline Mourão e Victor Santos (esqui cross country); e Isabel Clark (snowboard).

A novidade: esta será a primeira participação do Brasil em grande evento poliesportivo internacional sem Carlos Arthur Nuzman no comando do COB. O cartola, que dirigiu a entidade desde 1995, foi afastado e preso no ano passado, depois solto, suspeito de corrupção na escolha do Rio para sede da Olimpíada-2016. O COB é dirigido por Paulo Wanderley.

Stefano Arnhold é o chefe da missão nacional e acumulará a função de direção da equipe de desportos na neve. Ele é o presidente da confederação brasileira da especialidade. Matheus Figueiredo, presidente da Confederação Brasileira de Desportos no Gelo, comandará os atletas da sua área.

Os Jogos de Inverno serviram de pano de fundo para um episódio de triste memória para o esporte brasileiro. Aconteceu em janeiro, pouco antes da Olimpíada na cidade russa de Sochi, em 2014. Durante treinamento em montanhas nos Estados Unidos, a brasileira Laís da Silva Souza sofreu um acidente e lesionou a coluna cervical. Após cirurgias, a atleta ficou tetraplégica.

Ex-ginasta, Laís era conhecida dos torcedores, pois já havia participado dos Jogos Olímpicos de Verão de Atenas-2004 e Pequim-2008 e Mundiais. Só não esteve em Londres-2012 por causa de uma lesão na mão esquerda.

Logo depois, ela decidiu trocar a ginástica artística, que praticava desde os quatro anos, pelo esqui, modalidade na qual treinava, com vaga assegurada para aquela Olimpíada de Inverno.

Hoje ela vive em Ribeirão Preto, interior paulista, com rotina de fisioterapia e tratamento, e leva a vida dando palestras. Desde o acidente, conseguiu ficar de pé pela primeira vez em junho do ano passado.

O clima no Brasil é desfavorável para a prática de esportes de inverno, como os da Olimpíada. Em consequência, a falta de estrutura acompanha a ausência de uma política ideal de incentivo para o setor.

Com essa realidade, os interessados nesses esportes precisam de muita determinação para buscar seus objetivos. Se para os esportes em geral os recursos são escassos, mais difícil ainda para os esportes de inverno.

Jaqueline Mourão é um exemplo de determinação. Chegou a eles por acaso e agora aos 42 anos vai disputar sua sexta Olimpíada (de verão, Atenas e Pequim; de inverno, Turim, Vancouver, Sochi e PyeongChang). Praticante de mountain bike, ela estava no Canadá e ficou impedida de treinar com sua bicicleta por causa da neve. Para se exercitar apelou para o esqui. Descobriu um novo horizonte esportivo.

Há ainda atletas que residem no exterior, como Isadora Williams, nascida nos Estados Unidos, filha de uma brasileira. Neste caso, as condições locais são uma vantagem.

Os Jogos de Inverno, no entanto, parecem mais ecléticos na atualidade. Podem ser disputados em sedes sem as garantias de matéria prima da natureza –gelo e neve– no período do evento.

Foi assim em Sochi, na Rússia, quatro anos atrás. Os organizadores não esperaram pelo desafio climático. Providenciaram enormes quantidades de gelo e neve artificiais, fabricadas por máquinas e acumuladas em depósitos especiais nas montanhas.

Nada de surpresa. A festa exige selo de segurança e não pode parar. Em PyeongChang, a expectativa é que a "mãe natureza" não deve falhar. Mas, por via das dúvidas, estocou o produto garantidor.

Os organizadores acreditam na abertura mais fria dos Jogos dos últimos 20 anos. Avaliam até a possibilidade de distribuir cobertores aos torcedores, pois o estádio não recebeu cobertura por medida de economia e tempo.

Pequim, na China, a sede dos Jogos de 2022, também vai dispor de engenhocas para não ser pega de calça curta. Afinal, a neve de lá não é robusta o suficiente para suportar as necessidades olímpicas.

Essa logística está integrada ao processo olímpico de inverno. A participação no evento, realizado a cada quatro anos, de um país com o clima como o do Brasil, onde neve é coisa rara e de pouca densidade, também faz parte. Tal comportamento reforça o espírito de confraternização internacional que o evento propicia. Mas é de bom tom manter-se em guarda.

Por quê? Imaginem a potência e o poder dessas tecnologias de armazenar gelo e neve, e o ego de aventureiros mundo afora. Algum deles pode inventar de fazer uma Olimpíada de Inverno por aqui. Alguém duvida?

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.