Jornalista, foi colunista da Página 2 da versão impressa da Folha. É também comentarista do telejornal "GloboNews em Pauta" e da Rádio Metrópole da Bahia.
Era questão de tempo
BRASÍLIA - Reproduzo o que foi publicado aqui em 25 de agosto passado: "Ninguém pode ser contra um programa que leva médicos, mesmo estrangeiros, até populações que não têm médicos. Mas o meio jurídico está em polvorosa com a vinda de 4.000 [hoje já são mais de 7.000] cubanos em condições esquisitas e sujeitas a uma enxurrada de processos na Justiça".
Não deu outra. É óbvio que a médica Ramona Rodriguez está se usando e sendo usada politicamente: foi acolhida pelo oposicionista DEM e está sendo contratada por associação radicalmente contrária ao Mais Médicos. Mas ainda não é óbvio é se ela é um caso isolado ou se vai gerar uma enxurrada de processos na Justiça.
Elementos para isso não faltam, como juristas ilustres já alertavam desde o início. Como um médico cubano pode embolsar dez vezes menos que colegas venezuelanos, colombianos ou portugueses, ali nos municípios vizinhos, pelo mesmo trabalho, as mesmas horas e o mesmo contratante? Se não for ilegal, é no mínimo imoral.
Além de aguardar as respostas do Conare (órgão do Ministério da Justiça que analisa refúgios) e da embaixada americana (onde pediu visto), Ramona anunciou que pretende entrar com uma ação na Justiça exatamente por danos morais e pedindo ressarcimento da diferença de valores entre o que ela ganhava e o que os colegas de outros países ganham. E se a moda pega?
Há milhares de cubanos no Brasil com olhos, ouvidos e corações ligados nessa aventura, por ora solitária, de Ramona. Se ela tiver êxito –e as condições são favoráveis–, poderá servir de exemplo e criar uma legião de desertores do Mais Médicos. Uma tragédia política para o governo.
Esse movimento, porém, não é nada fácil. Diferentemente dos colegas de outros países, os cubanos não puderam trazer suas famílias, que ficaram na ilha, à mercê do regime. Sabe-se lá a que tipo de punições e constrangimentos estão sujeitos.
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