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humberto luiz peron

 

31/08/2010 - 11h47

100 anos

HUMBERTO PERON
Colaboração para a FOLHA

Fiado? Só quando o Corinthians for campeão.

Com certeza, essa foi uma das primeiras frases que consegui ler. Talvez, por isso, ela ficou marcada na minha memória. Mas, confesso que até hoje nunca gostei dela e não gostava de observar essas palavras em vários lugares no início da década de 1970.

Não era pelo significado das palavras que eu não gostava. Fiado, por exemplo, eu só fui descobrir o que era quando eu vi o meu pai pagando, de uma vez, a conta das pipocas de canjica que eu pegava na venda da esquina durante a semana.

Já o verdadeiro sentido da palavra campeão eu só descobri o prazer e a felicidade que ela proporciona num dezembro de 1974.

Mas, eu não gostava dessa frase porque as pessoas riam do Corinthians. Você já deve ter percebido pelo final do parágrafo anterior que eu não sou corintiano, mas eu não gostava que se falasse mal do outro time que mais eu ouvia falar.

Também pudera, eu nasci no Bom Retiro, no máximo, uns cinco minutos do local onde o clube foi fundado em 1910. No inícios dos anos 1970, o bairro ainda era dividido entre corintianos e palmeirenses.

Havia as brincadeiras de sempre, mas como nos inúmeros casos de irmãos que torciam pelos dois rivais no bairro, no final sempre havia a cumplicidade ou respeito --entre os torcedores dos dois times.

A grande massa corintiana que não era do bairro eu via quando ficava sentado ao lado do meu avô, na calçada da Rua Sérgio Tomás. Acompanhava o trajeto dos torcedores indo da Avenida Rudge para a sede da Gaviões da Fiel.

Muitos passavam e cumprimentavam,outros até brincavam sabendo que aquele menino e o senhor não torciam pelo Corinthians, com a esperança que o jejum de títulos iria acabar.

Assim, como não torcer pelo Corinthians no célebre jogo da invasão corintiana ao Rio de Janeiro? Naquela partida contra o Fluminense, válida pelas semifinais do Brasileiro de 1976, a preferência de muitos (torcer seria um termo muito forte) foi dada aos corintianos.
Duros na queda, alguns diziam, numa época de grande bairrismo entre paulistas e cariocas, que preferiam um time de São Paulo na final. Mas, na verdade, não havia como não ficar comovido com as imagens dos corintianos, ainda eles eram apenas corintianos e não um bando de loucos, que chegavam do Rio.

Finalmente, já em 1977, veio a redenção. Numa autêntica epopeia em que se transformou a série de partidas finais contra a Ponte Preta, finalmente o Corinthians conquistou um título de campeão. Os 23 anos de angústia tinham acabado, por isso, não saem da memória as cenas de invasão do gramado do Morumbi para a comemoração do título mais importante da história do clube.

Fiado? Só quando a democracia chegar.

Se até o Corinthians já tinha sido campeão, chegaria também o dia em que teríamos a chance de escolher quem iria governar o país. Também não precisávamos mais esconder pessoas, em nossas casas, que precisavam fugir das ditaduras que infestavam a América do Sul. Queríamos a liberdade, mesmo hoje sabendo que alguns exemplos que tínhamos liberdade se transformaram em ditaduras ou acabaram.

Aí, no início dos anos 1980, surge a Democracia Corintiana, que já mostrava a vocação pela diversidade e pluralidade na formação do time.

Havia jogadores folclóricos, identificados com a torcida, como Biro-Biro e Ataliba. Os clássicos, como Zenon e Eduardo. Apareceu até o Leão, que chegou quando a democracia dos jogadores estava madura, que não concordava com que os companheiros pensavam, mas que em campo esquecia as diferenças pessoais e jogava muito, por ele e por seus companheiros.

Tinha o líder Sócrates. A antítese de tudo que poderia ser pensar de um jogador de futebol na época. Era alto, não era atleta e não dispensava um copo de cerveja. Mas era craque, líder e falava de assuntos sobre os quais nenhum atleta da época falava. Sem dizer que surgia o Casagrande. O centroavante e artilheiro de pouco mais de 19 anos, cabelos cumpridos e as meias arriadas que simbolizavam a rebeldia que muitos jovens gostariam de ter.

Fiado? Só quando o Corinthians ganhar o Campeonato Brasileiro.

Não havia mais como incomodar os corintianos após o final do jejum de títulos paulistas. Então, os torcedores dos outros times diziam que o Corinthians era um time caseiro --as mesmas histórias que você ouve hoje quando se fala que o clube nunca conquistou a Libertadores.

Mas, liderado por Neto, o time acabou ganhando o Brasileiro, derrubando o São Paulo na final. O time campeão do Nacional de 1990 tinha uma virtude marcante de muitos times vencedores do Corinthians nesses 100 anos de vida que é vencer campeonatos com elencos tecnicamente inferiores aos seus rivais.

Fiado? Só quando o Corinthians jogar bonito.

Acabei de dizer que o Corinthians sempre foi um time que usou a vontade para bater seus adversários. Mas, no final da década de 1990, foi formado um time com jogadores técnicos, que jogava bonito e com muita técnica. O time conquistou o bicampeonato brasileiro, o Mundial e o Rio-São Paulo. Um ciclo de futebol técnico e bem jogado que começou comandado por Vanderlei Luxemburgo, passou por Osvaldo de Oliveira e terminou com Carlos Alberto Parreira.

Fiado? Só quando o Corinthians voltar à Série A.

O dinheiro fácil e não declarado fez que o Corinthians saísse das páginas esportivas para ir para as páginas policiais. Com tantos problemas administrativos e desmandos, o time sentiu no gramado e o clube foi rebaixado, em 2007, para a Série B do Campeonato Brasileiro, talvez o momento mais triste da história do clube. Mas, em pouco tempo, com sua grandeza e com o mínimo possível de organização, o time conseguiu contratar um técnico, Mano Menezes, que reconstruiu um elenco e fez o time subir, sem nenhum problema. Ainda para coroar o acesso, o clube trouxe Ronaldo.

Fiado? Só quando o Corinthians ganhar a Libertadores.

Sempre vai faltar espaço para falar da história centenária de um time como o Corinthians. Mas, todo corintiano tem um motivo para ser orgulhar. Quem realmente gosta de futebol, mesmo não torcendo pelo clube, em pelo menos um instante, torceu ou se emocionou com o Corinthians. E isso, vale muito mais que uma simples conquista da Libertadores ou ter um estádio que parece que finalmente vai sair do papel.

Até a próxima.

Mais pitacos: www.twitter.com/humbertoperon

DESTAQUE

Para Internacional e Santos, que mesmo com a vaga na próxima Libertadores (os gaúchos ainda vão disputar o Mundial em dezembro), não deixaram de lado a disputa do Brasileiro e com uma série de vitórias consecutivas já tentam encostar nos líderes do torneio Corinthians e Fluminense. Além de ser bom para o campeonato, que vai ficar mais disputado, a boa campanha de santistas e colorados também ajudam os demais clubes que lutam por uma vaga na Libertadores de 2011, pois abre a possibilidade de até o sexto colocado no Brasileiro conseguir uma vaga no torneio continental.

ERA PARA SER DESTAQUE

Agora, com o final da janela de transferências para os clubes europeus, os elencos dos clubes do Campeonato Brasileiro não devem ter muitas mudanças. Até setembro, reforços só os jogadores das séries inferiores ou atletas que estiverem sem contrato no exterior. Se a dança dos técnicos já está muito alta, agora ela tende a aumentar muito mais, pois os dirigentes vão tentar esconder a falta de critério nas contratações mandando treinadores embora.

humberto luiz peron

Humberto Luiz Peron é jornalista esportivo, especializado na cobertura de futebol, editor da revista "Monet" e colaborador do diário "Lance". Escreve às terças-feiras no site da Folha.

 

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