É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.
Veemência e ignorância
SÃO PAULO - A ignorância geográfica dos americanos é proverbial. Um pequeno estudo dos cientistas políticos Kyle Dropp, Joshua Kertzer e Thomas Zeitzoff não só confirma isso como ainda mostra que há uma correlação positiva entre o tamanho do desconhecimento e a estridência, isto é, a disposição para lançar-se numa aventura militar.
Dropp e seus colaboradores perguntaram a uma amostra representativa de 2.066 norte-americanos o que eles achavam que seu país deveria fazer em relação à crise na Ucrânia. Depois, pediram a cada um dos entrevistados que marcasse num mapa onde fica a Ucrânia.
Como esperado, apenas 16% foram capazes de localizá-la corretamente. A maioria, pelo menos, apontou para algum lugar entre os continentes europeu e asiático, mas houve quem indicasse o Brasil (oito pessoas) e mesmo o meio do oceano Pacífico (um indivíduo).
O mais interessante, contudo, foi constatar que, quanto mais longe do lugar certo o entrevistado punha a Ucrânia, mais ele defendia que os EUA interviessem militarmente.
O vínculo entre veemência e miopia política não é novo nem está limitado a cidadãos anônimos sorteados para responder pesquisas. Num estudo já clássico publicado em 2005, o psicólogo Philip Tetlock coletou, ao longo de 20 anos, 28 mil prognósticos feitos por 284 experts em economia e política e os comparou com os desfechos do mundo real. Na média, os cientistas se saíram milimetricamente melhor do que o acaso.
O ponto central, porém, é que, também aqui, aqueles que eram mais tonitruantes erraram mais, enquanto os mais comedidos, que em vez de certezas expressavam dúvidas e probabilidades, se saíram melhor.
A mensagem a extrair desses trabalhos, penso, é: desconfie da virulência. Em geral, quem está muito convicto de algo, é porque não se deu ao trabalho de estudar o caso e perceber suas nuances.
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