É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.
Campanha infeliz
SÃO PAULO - Alguém no Ministério da Saúde pisou na bola. O objetivo é até louvável: combater o racismo. Mas os argumentos utilizados, uma combinação de estultice estatística com avidez ideológica, são tão fracos que assustam.
Um dos cartazes da campanha reza: "Diz que não existe racismo, mas"¦ em 2012 a taxa de mortalidade por doença falciforme entre pessoas pretas foi de 0,73 mortes e 0,28 entre pardas, enquanto na população branca foi de 0,08 (por 100.000 hab.). A maioria não sabe, mas a população negra precisa de cuidados específicos para doenças como a anemia falciforme. Se presenciar casos de racismo na rede pública de saúde, disque 136 e denuncie".
Estou convencido de que o racismo institucional é uma realidade, mas o raciocínio usado na peça publicitária não prova isso.
A anemia falciforme é causada por uma mutação genética específica. Se a pessoa herda o gene mutante de apenas um dos genitores, ganha certa proteção natural contra a malária. Se o recebe dos dois, o resultado, catastrófico, é a anemia. Como o gene tem valor adaptativo –confere vantagem a quem vive em áreas infestadas pelo Plasmodium–, não foi eliminado pela seleção natural.
O resultado desse processo é que a moléstia falciforme afeta com frequência bem maior as populações negra e parda, cujos ancestrais vieram mais recentemente da África, onde a malária é endêmica. Taxas maiores de mortalidade para negros e pardos são, portanto, esperadas.
O ministério poderia ter um ponto se mostrasse que negros morrem proporcionalmente mais considerado o conjunto das pessoas que têm a doença. Mas, mesmo assim, para afirmar que isso se deve a racismo e não a outros motivos, teria de controlar os resultados para fatores como renda, escolaridade, geografia etc.
Se alguém merece ser denunciado por racismo aqui, é a natureza, ou Deus, para os que acreditam.
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