Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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Hélio Schwartsman

Escolha bem seus palavrões

Uma injúria racial ainda é apenas um xingamento, uma infração menor

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Xingar Deus já foi crime na maioria dos sistemas legais. Ainda o é em alguns países muçulmanos. No Afeganistão, a blasfêmia pode render pena de morte por enforcamento. E os afegãos são gentis quando comparados aos portugueses da Baixa Idade Média. Nas Ordenações de D. Duarte, a pena prevista para "quem quer que descreer de deus E de sua madre ou os doestar" era ter a língua tirada "pello pescoço" e depois ser queimado.

Se você, leitor progressista, crê que o Ocidente fez bem em revogar as leis antiblasfêmia, então deveria pensar duas vezes antes de aplaudir a proposta que tramita no Congresso de equiparar a injúria racial ao crime de racismo e ampliar sua pena, que seria de até cinco anos de reclusão.

Não me entendam mal. O racismo é uma grave violação moral. E acho ótimo que a rejeição veemente ao racismo tenha se tornado hoje um consenso social. O ponto, porém, que já defendi neste espaço, é que não devemos instrumentalizar o direito penal para reforçar nossas convicções morais. Direito e moral são fenômenos distintos, que funcionam sob lógicas diferentes.

Por maior que seja nosso repúdio ao racismo, uma injúria ainda é apenas um xingamento, uma infração menor. Se a equiparação vingar, o sujeito que chama o outro de "filha da puta" ficará sujeito a pena máxima de seis meses de detenção ou multa, mas, se o termo escolhido para insultar for alusivo a raça, a sanção poderá ser de até cinco anos de reclusão e multa. A conduta, ressalte-se, é rigorosamente a mesma: ofender a dignidade de alguém; só o que muda é a seleção lexical.

Pior, pelo projeto, a injúria racial também se tornaria delito imprescritível e inafiançável. Alguém poderia ser trazido para o banco dos réus aos 70 anos por ter usado o impropério errado numa discussão que teve aos 18. Estaríamos no limiar do pensamento mágico, que torna certas palavras tabu.

Sistemas penais precisam ter um mínimo de congruência.

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