Igor Gielow

Repórter especial, foi diretor da Sucursal de Brasília da Folha. É autor de “Ariana”.

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'Presidência Público-Privada' poderá embasar eventual campanha de Doria

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Crédito: Adriano Vizoni/Folhapress Sao Paulo,SP,Brasil 27.03.2017 SAO PAULO - SP - BRASIL, 27-03-2017, 20h00: PREFEITO DORIA. Lancamento do programa Nova Creche, com o ministro da Educacao, Mendonca Filho, o governador Geraldo Alckmin e os secretarios de educacao Alexandre Schneider (municipio) e Renato Nalini (estado), realizado no Theatro Municipal. (Foto: Adriano Vizoni/Folhapress, COTIDIANO) ***EXCLUSIVO FSP*** Foto: Adriano Vizoni/Folhapress Cod 3558
Doria, ao centro, no lançamento do programa Nova Creche, na segunda (27) em SP

João Doria, o prefeito tucano de São Paulo, é candidato à Presidência da República em 2018. Pode até não concorrer. Tudo depende de fatores que vão da viabilidade de seu padrinho, o governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP), à sempre inerente, para um político, possibilidade de ser abatido. Mas hoje é presidenciável.

Se o pleito do ano que vem está sendo desenhado pela tinta de canetas que assinam despachos no Judiciário e preenchem autos de apreensão policial, a eventualidade da disputa com um Doria isolado das agruras da Lava Jato insinua uma campanha calcada na promessa de uma "Presidência Público-Privada".

Não falo apenas da multiplicidade de recursos ao empresariado, em busca de doações ou programas mais estruturados, empreendidos por Doria. O movimento parece ser bem mais amplo do que uma propaganda gratuita em jogo do Brasil, por mais simbólico que isso seja.

Na noite de segunda (27), o prefeito conseguiu reunir em São Paulo a nata do sistema bancário para prestigiar um evento sobre criação de creches. Foi tão ou mais eloquente do que o convescote com seus pares da elite mais estrelada paulistana, ocorrido na semana passada e no qual só não foi lançado candidato porque Alckmin estava presente.

Toda a indicação no entorno do prefeito é de que ele vai aprofundar a simbiose com o empresariado e fazer dela uma pedra de toque, seja de seu mandato, seja numa corrida eleitoral. O problema mais óbvio da estratégia é que, afinal de contas, estamos no Brasil.

Como o que já vazou das delações da Odebrecht deixa claro, a relação dos donos do dinheiro com os do poder é antiga e patológica. No Planalto, o PT criou sua modalidade de "Presidência Público-Privada", com rios de corrupção a irrigar o que na superfície era uma falsificação dos conglomerados de "campeões nacionais" de lugares como a Coreia do Sul e a França.

Deu no que deu. O petrolão destruiu o PT. O voluntarismo de seu último esbirro de governo, a gestão Dilma Rousseff, pôs a pá de cal no projeto ao desmilinguir a economia. A sigla esperneia por sua enésima reinvenção, amparada, como sempre, na figura de Luiz Inácio Lula da Silva.

Um argumento de apoiadores do prefeito é que o próprio arcabouço lançado pela Lava Jato impedirá qualquer malfeito numa relação renovada. O próprio Doria já pontuou o que deve ser seu discurso sobre o caso: diz que faz tudo à luz do dia.

Pode ser, mas além de dúvidas sobre favorecimentos pouco impessoais, a prudência recomendada pelo histórico brasileiro sempre dará margem a desconfianças mais do que justificadas. Elas são reforçadas pelo caráter patrimonialista da população, que segundo pesquisas disponíveis ama um Estado forte, sugerindo uma "capitalismofobia" meio atávica.

Estando estabelecida a barra moral dos dias de hoje em algum círculo dantesco, caberá a Doria e aos empresários fazerem tudo direito para convencer a população sobre a funcionalidade dessa "PPP". E saber embalar o produto para consumo do eleitor em plena vigência da Lava Jato, algo complexo.

O teste está em curso agora, em São Paulo. Obviamente, Doria precisa mostrar serviço além de ações de marketing, de se vestir disso ou daquilo. Se ao fim tiver sucesso na redução das filas de exames da rede de saúde, terá um trunfo importante. A ação das creches, também. Uma cereja eventual para o bolo seria a revitalização funcional da cracolândia, embora um passeio na região no centro de São Paulo desestimule expectativas favoráveis.

Conseguir fazer uma gestão bem avaliada, opinam aliados mais otimistas, lhe dará argumentos para ficar onde está ou buscar voos mais altos. A Presidência, dizem, só será opção se Alckmin estiver muito ferido pela Lava Jato ou pesado demais nas pesquisas. No caso de o governador estar em forma e a cantada fritura do senador Aécio Neves (PSDB-MG) na chapa do ministro Edson Fachin ocorrer, sempre haverá a busca pelo Bandeirantes ou seguir na própria cadeira.

No xadrez interno tucano, Doria tem uma vantagem semelhante à de Alckmin: distância respeitosa do governo de Michel Temer (PMDB). Recentemente, o prefeito criticou a ideia de deixar a reforma previdenciária de Estados e municípios para um segundo momento. Não bastassem os problemas na Lava Jato, Aécio e o senador José Serra (PSDB-SP), por sua vez, pregaram adesão orgânica a Temer desde o impeachment de Dilma, e correm riscos que vão da cassação do presidente pelo TSE ao pântano da impopularidade por tabela.

Por fim, o prefeito segue surfando a onda do antipetismo que varre São Paulo desde 2014 e espraiou-se em 2016 pelo país. Vem ocupando espaço enquanto outros líderes tucanos mantêm a fleuma: chamou Lula de "cara de pau" e protagonizou uma troca de farpas pública com Ciro Gomes. O ora pedetista busca viabilizar sua terceira campanha presidencial contando com a desistência ou impedimento legal do líder petista, e seu apoio, além de carregar o ativo de não estar citado na Lava Jato.

Cabe notar que o antipetismo ganhou pé no Nordeste, ainda um reduto de Lula, com a ascensão do prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM). Não é casual a citação a seu nome como vice do campo conservador em 2018.

O jogo pode estar no começo, mas está em pleno curso.

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