José Luiz Portella Pereira, 60, é engenheiro civil especializado em gerenciamento de projetos, orçamento público, transportes e tráfego. Foi secretário-executivo dos Ministérios do Esporte e dos Transportes, secretário estadual dos Transportes Metropolitanos e de Serviços e Obras da Prefeitura de São Paulo e presidente da Fundação de Assistência ao Estudante. Formulou e implantou o Programa Alfabetização Solidária e implantou o 1º Programa Universidade Solidária. Escreve às quintas-feiras.
Direito à cidade - Plano Diretor
É o momento ideal para criarmos uma estrutura jurídica que garanta o direito à cidade.
Começamos perceber a importância de moldar a cidade segundo nossas próprias conveniências. Sermos agentes e não complementos.
Para tanto, precisamos de normas que assegurem a cidade que desejamos. A cidade com a dimensão humana.
Wilson Levy, no seu projeto de doutorado "Por um Conceito de Direito à Cidade", mostra que a legislação urbana tem origem ruim, foi mal cuidada e maltratada por muito tempo. E que quando tivemos o avanço da lei chamada Estatuto das Cidades, o meio jurídico descuidou-se do assunto, desamparando o que poderia ser um marco histórico de redenção.
Sem lei não há direitos. Está na hora exata de nos recuperarmos.
O levantamento histórico de Levy assinala que os primeiros passos da legislação urbana no Brasil se dão em 1446 (Ordenações Afonsinas), vigente em 1500, e em 1521 (Ordenações Manuelinas). Mas com foco errado. Era associado ao lado judiciário e fiscal. Expressava o desejo da Coroa Portuguesa na exploração de riquezas ou na ocupação rural para abastecer a metrópole. Diferentemente do modelo espanhol, que organizou a ocupação das cidades.
E foi lá, no tempo do Brasil Colônia, que está a origem das irregularidades fundiárias do país.
Como corrigir problema tão velho? Mudar radicalmente a legislação, fugindo dessa tradição formalista e da visão fatiada do conhecimento jurídico. A cidade é um algo a mais, para além do direito de propriedade (direito privado) e do direito de construir (direito público).
A hora certa para São Paulo é agora, quando elaboramos o novo Plano Diretor da cidade. O desafio é colocar a dimensão humana em arcabouço jurídico simples, fácil de compreender e de implantar.
Assim surgirá o Direito à Cidade. Como conjunto de normas e como disciplina que estude e esgote a forma prática de a cidade virar um lugar bom para se viver. Com fundamentos não só na "visão estreita em torno de posse e propriedade", como destaca Wilson Levy.
Cabe colocar nesse molho Filosofia, Sociologia, Romantismo.
"Por décadas, a dimensão humana tem sido esquecida, enquanto ganha força a acomodação do brutal aumento do tráfego de automóveis", destaca Jan Gehl, arquiteto, na abertura do seu excelente e seminal livro: "A Cidade Para as Pessoas".
Isso é uma estratégia suicida. A cidade vira um meio de passagem e não de vida. Enquanto a vida se dá em edifícios fechados e cada vez mais isolados.
O direito a ter uma praça perto de casa, de andar sem atropelos, de enxergar o horizonte e respirar ar puro é vital. Não pode se transformar em quimera. Em sonho impossível.
Quem move a gente é a vontade de fazer. Quem garante a perenidade do que queremos é a norma legal. Precisamos entender que mudar as coisas não se esgota em ter vontade e sair fazendo planos. É essencial que os direitos sobre coisas tangíveis e intangíveis que o cidadão quer sejam perenes.
Necessitamos da Lei. Da consciência dela. E de uma vontade inquebrantável de não deixar que as conquistas virem "a lei que não pegou".
A Justiça garante a norma. A sociedade assegura que ela seja de fato aplicada.
O Direito à Cidade é a conquista do momento. A questão é não perder esse pênalti que o Plano Diretor propiciou. Não deixar passar a oportunidade.
Gabriela Carvalho/Folhapress | ||
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