Leandro Narloch

Leandro Narloch é jornalista e autor do Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, entre outros.

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Leandro Narloch

Seria possível privatizar a polícia?

Brasil tem 1,7 milhão de vigilantes privados contra 602 mil policiais civis, militares e federais

Não é novidade que funcionários públicos têm pouco incentivo para trabalhar com eficiência. Não serão demitidos e, via de regra, ganharão o mesmo se prestarem um serviço capenga ou exemplar.

No caso dos policiais, o estímulo é ainda menor. Não só falta a eles um incentivo racional para a eficiência como há muitos motivos para deixarem de prevenir crimes, investigar ou perseguir criminosos. Pois trabalhar bem nessa atividade significa correr mais perigo.

Pior ainda, é enorme a tentação de se aliar ou fazer vista grossa ao crime. O policial correrá menos risco (e terá mais dinheiro no bolso) se aceitar propostas de máfias ou de pequenos criminosos. Não à toa, a ronda diária de policiais civis de muitos estados brasileiros consiste em coletar propina de comerciantes ou donos de casas de shows, enquanto pouquíssimos homicídios são esclarecidos no país.

 
Movimentação de policiais militares antes de protesto em São Paulo
Movimentação de policiais militares antes de protesto em São Paulo - Taba Benedicto/Folhapress

É difícil acreditar que a intervenção federal vai mudar esses incentivos perversos e resolver a criminalidade no Rio de Janeiro. Seria o caso, então, de privatizar a polícia?

Na prática, já é o que fazemos. O Brasil tem 1,7 milhão de vigilantes privados contra 602 mil policiais civis, militares e federais (dados de 2009). Do vigia noturno à escolta armada, confiamos nossa segurança mais a empresas que a governos.

Na média mundial, há 348 seguranças privados e 318 policiais públicos a cada 100 mil habitantes, segundo estudo do sociólogo holandês Jan van Dijk. Na Suíça, uma empresa de segurança privada faz o policiamento preventivo de trinta pequenas cidades.

No Brasil, o investimento em segurança é redundante. Contribuintes bancam a polícia pública e diversos condomínios de um bairro pagam empresas privadas de vigilância. Não seria mais fácil seguir o exemplo suíço e contratar uma só empresa e uma seguradora para se encarregarem da segurança de todo o bairro?

O Brasil tem hoje 564 mil mandados de prisão em aberto (quase o total de presos no país), segundo o Conselho Nacional de Justiça. Não deve demorar para termos mais foragidos que presos no país.

O caçador de recompensas do cinema poderia ajudar a reduzir esse número. Em casos isolados, polícias brasileiras oferecem recompensas em troca de informações sobre o paradeiro de criminosos. Poderiam sistematizar essa oferta e permitir que empresas se especializem em levar foragidos à Justiça.

Essas propostas não são panaceias: nos Estados Unidos, caçadores de recompensas matam foragidos que tentam capturar e enganam a polícia oferecendo inocentes no lugar de criminosos. Também é fácil imaginar contratos superfaturados de empresas de segurança contratadas por prefeituras. Seria preciso um bom desenho de contrato para evitar a captura regulatória.

Do jeito que está, mais investimento ou "vontade política" não vão dar em nada. A polícia brasileira está desenhada para santos incapazes de cometer pecados acontece que os policiais, em geral, teimam em agir como pessoas normais que obedecem a incentivos.

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