É editora de 'Mundo' e foi correspondente em Nova York, Genebra e Washington. Escreve às sextas sobre séries de TV.
Indie e trintão? Vai gostar de 'Togetherness'
Você assiste a séries para quê? Pensar, se distrair, rir, se esquecer da vida? Ou, ao contrário, constatar que a sua vida até que não é tão ruim assim?
Quem achar que a segunda resposta faz sentido e estiver perto (ou passado) dos 30 tem boa chance de gostar de "Togetherness", comédia em oito episódios que a HBO estreou no mês passado e da qual acaba de encomendar uma nova temporada. Em caso de hipsters e gente vidrada em coisas indie em geral, as chances redobram.
"Togetherness" é obra dos irmãos Jay e Mark Duplass, que fizeram fama primeiro como curta-metragistas, depois com filmes independentes e mais adiante como os charlatões que competem com a clínica da protagonista em "Projeto Mindy". Jay, o mais velho, pode ser visto como o filho de um pai transgênero em "Transparent", da Amazon.
Lucy Nicholson/Reuters | ||
Atriz Amanda Peet da série 'Togetherness' |
Aqui, Mark interpreta Brett, um técnico de som às voltas com uma carreira medíocre no cinema, dois filhos pequenos, uma mulher descontente (Melanie Lynskey, a adolescente perturbada de "Almas Gêmeas"), um melhor amigo desempregado (Steve Zissis, coautor) e a cunhada fútil (Amanda Peet).
Todos vivendo juntos (eis o título, "proximidade"), todos flertando com a crise da meia-idade.
O argumento/roteiro parece receita de bolo –e é, com o agravante de uns 70% das séries americanas tratarem de famílias disfuncionais. "Togetherness", porém, acerta em outros pontos.
A química entre os atores é excelente. Em muito ajudada pelo fato de Duplass e Zissis serem amigos antigos, mas também porque Peet e Zissis formam aquele tipo de anticasal que não combina em nada, à primeira vista, mas se entende perfeitamente em cena e pelo qual se torna impossível não torcer um pouquinho.
Segundo, como os diretores já admitiram, o material para a série foi escarafunchado em vidas de verdade, a começar as da própria dupla.
O casal principal ainda sofre com a falta de sono das noites interrompidas pelo choro do caçula; a cunhada envelhecendo preocupada por não ter par; o amigo, que é ator, não conseguiu corresponder profissionalmente às expectativas criadas quando adolescente. As neuroses explodem na convivência.
A melhor parte coube a Melanie Lynskey. Como a dona de casa Michelle, meio frustrada, meio feliz, desajeitada e dona de uma sensualidade muito sutil, ela tem dominado os episódios.
É, ao menos nesses primeiros capítulos despretensiosos, a única que promete surpresas e algumas camadas além das piadas fáceis e do humor físico. É Lynskey também –e não Zissis, cuja vida parece tão imperfeita– a responsável pelas notas melancólicas da série.
A HBO estava com duas comédias geniais em sua grade de domingo, "Veep" e "Silicon Valley", que ambicionam um público mais variado. Ambas voltam com novas temporadas em abril. "Togetherness" é uma obra menor, mas que pode cativar de forma indefectível um público bastante específico, porém numeroso, atrás de conforto.
Livraria da Folha
- Coleção "Cinema Policial" reúne quatro filmes de grandes diretores
- Sociólogo discute transformações do século 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade