É engenheiro e economista, ex-presidente do BNDES e ex-ministro das Comunicações. É sócio e editor do site de economia e política "Primeira Leitura".
Uma aposta errada nos EUA
Os mercados financeiros internacionais viveram um novo dia de pânico na quarta-feira. O epicentro desse terremoto mais recente ocorreu no segmento de juros americanos, um dos mais líquidos e calmos entre todos os outros que compõem a arquitetura financeira moderna.
A flutuação dos preços -e, portanto, dos juros- dos títulos de dez anos emitidos pelo governo americano foi realmente selvagem. Em poucos momentos de negociações o valor desses papéis caiu incríveis 5,4%, queda que poucos operadores experientes poderiam imaginar.
Como a maioria dos negócios é realizada nos mercados futuros, via sofisticados programas de computador, essa variação de preços inesperada e brutal provocou o que se chama, na língua do Tio Sam, de "sell off". Traduzido para nossa língua, esse termo que dizer: "Salve-se quem puder porque os prejuízos serão grandes".
Os gênios da raça -a grande maioria- que tinham quase certeza de que o próximo grande movimento nesse mercado seria de alta dos juros -e queda dos preços dos papéis- iniciaram uma corrida maluca para limitar seus prejuízos. Como sempre acontece nesses momentos, o pânico se instala e os preços chegam a níveis irracionais também.
O incrível é que a mídia no dia de hoje não fala dessa situação e associa a queda dos juros nos EUA a uma visão catastrófica na economia. Isso não é verdade, pois o crescimento americano está se estabilizando e deve chegar a mais de 2,5% neste ano e no próximo.
Com o Fed deixando o aumento de juros para mais tarde, ficam reforçadas as defesas contra a onda deflacionista que vem da Europa. Outra âncora para manter os juros quietos é a inflação abaixo da meta do Fed, tendência reforçada recentemente com a queda significativa dos preços do petróleo.
O gatilho para o "sell off" dos últimos dias foi a declaração sempre curta, mas firme, de Stanley Fischer, vice-presidente do Fed e hoje o principal nome técnico da instituição. Ele disse aos jornais que em uma situação de economia mais fraca fora dos Estados Unidos -como ocorre agora- o Fed seria mais lento na normalização da política monetária americana.
Um sinal claro para os mercados de que a aposta na alta dos juros americanos estava fundamentalmente errada e que os mercados de títulos de juros deveriam corrigir seus preços. Da publicação de suas palavras na mídia especializada até o início da correria desenfreada dos especuladores foi um pulo.
Em um mundo totalmente ligado pelas mesas de operações das instituições financeiras, a onda de nervosismo e irracionalidade iniciada em Wall Street espalhou-se pela Europa e por mercados emergentes como o Brasil.
Em cada país a mídia e os operadores de mercado encontraram em questões locais -como as eleições do próximo dia 26 aqui no Brasil- motivações secundárias para justificar a queda das Bolsas de Valores e a volatilidade nos mercados de juros e câmbio.
Pouco a pouco, ao longo do dia, a verdadeira causa dos movimentos do mercado -"sell off" dos juros norte-americanos- foi sendo esquecida, e os jornais brasileiros, e de outras regiões do mundo, no dia seguinte falavam apenas na falta de confiança na economia americana e nos riscos de o mundo todo cair em uma nova e sincronizada recessão.
Quando a paz voltar ao mercado e as análises fundamentadas substituírem os comentários menores dos analistas e da mídia, o que deve ficar dessa confusão será muito positivo.
Com o cenário de mudança na política monetária americana empurrado para fins de 2015, os juros baixos vão fortalecer o crescimento futuro e, com isso, criar uma força compensatória para outro ataque de pessimismo em relação à economia da União Europeia.
Ajudará também a China nessa transição de política econômica baseada nas exportações e investimentos em infraestrutura para o consumo interno. E também o Brasil, se o próximo governo devolver aos principais agentes econômicos a confiança e o respeito pela condução da economia.
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