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manuel da costa pinto

 

26/08/2012 - 02h30

Livro reúne imagens que mostram construção do imaginário de Fellini

DE SÃO PAULO

A imagem que Federico Fellini (1920-1993) deixou em seus apaixonados espectadores é a do mais italiano dos diretores. Impulsivo e nostálgico, de imaginação desgovernada e narcisista, ele povoou seus filmes de personagens grotescos (anões de circo, prostitutas com formas opulentas, velhotes libidinosos) e sofisticados (basta citar seu "duplo", o ator Marcello Mastroianni, expressão da elegância e da espontaneidade italianas).

Divulgação
Marcello Mastroianni e Anita Ekberg em cena do clássico "A Doce Vida", de Federico Fellini
Marcello Mastroianni e Anita Ekberg em cena do clássico "A Doce Vida", de Federico Fellini

O livro "Tutto Fellini", lançado com mostra homônima, confirma todas as ideias feitas sobre o diretor de "Amarcord". Organizada por Sam Stourdzé, diretor do Museu de l'Elisée, na Suíça, a obra traz fotos, imagens dos filmes e de seus bastidores, cartazes e esboços cenográficos.

Um dos destaques são as cinco ilustrações de "O Livro dos Sonhos", álbum póstumo em que o diretor misturou frases e desenhos para transpor suas angústias e obsessões noturnas. Numa das mais divertidas, o menino Federico, vestido de marinheiro, sobe aos céus num cesto de balão em companhia do papa Paulo 4º, dando de cara com uma gigantesca mulher de maiô. É a síntese de Fellini: um erotismo anticlerical, porém submisso ao imaginário familiar, no qual as fêmeas mais selvagens assumem a forma da "mamma" protetora e opressiva.

A publicação é dividida em temas que explicam o imaginário felliniano. A seção de "As Fotonovelas", por exemplo, revela suas matrizes popularescas. Já "O Mito da Fontana de Trevi" explica que a célebre cena de Mastroianni e Anita Ekberg, em "A Doce Vida" (1960), foi inspirada por uma fotografia de 1958 que flagrava a atriz sueca no monumento romano.

Os fotógrafos que aparecem no filme, aliás, merecem capítulo à parte, pois foi no longa que Fellini criou o termo "paparazzi" para os caçadores de celebridades. Aqui, justamente, entramos no aspecto mais importante do livro.

A obra lembra como, a partir de "Oito e Meio" (cujo protagonista é um diretor em crise), Fellini não apenas explicita o conteúdo autobiográfico de seus filmes, mas usa a própria indústria cinematográfica como tema. Não se trata de metalinguagem, mas de um combate estético em que as imagens oníricas, para resistir ao efeito anestesiante do cinema comercial e da banalização televisiva, devem neutralizar o fetichismo da sociedade do espetáculo. Por trás do artista circense, portanto, há um geômetra que calcula o alcance das verdades da encenação.

LIVRO
TUTTO FELLINI * * * *
AUTOR: Sam Stourdzé
EDITORA: Instituto Moreira Salles/Sesc edições (184 págs., R$ 65)

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CONEXÕES

FILME
ENTREVISTA COM FEDERICO FELLINI * * *
Quando japoneses invadem uma filmagem, Fellini explica seu processo criativo e encontra velhos amigos, num falso documentário sobre sua poética em tempos de estética televisiva.
DIRETOR: Federico Fellini
DISTRIBUIDORA: Paragon (1987, R$ 39,90)

LIVRO

CONFLITO E INTERPRETAÇÃO EM FELLINI * * * *
O crítico brasileiro propõe uma interpretação ousada de Fellini, mais política e cerebral, na contramão da imagem do diretor autobiográfico, atado a suas nostalgias.
AUTOR: Luiz Renato Martins
EDITORA: Edusp (1994, 160 págs., R$ 26)

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LIVRO

CINCO NOVELAS EXEMPLARES * * *
Miguel de Cervantes; tradução de Nylcéa Thereza de Siqueira Pedra (Arte & Letra, 220 págs., R$ 38)
Criador do romance moderno com "Dom Quixote", Cervantes também inaugurou o gênero novelístico em castelhano, com relatos "exemplares" no sentido moral (ensinamentos sobre a parvoíce humana) e como modelo literário. O volume completa as 12 novelas publicadas em separado pela editora, que, assim, infelizmente quebra o elo sutil entre elas.

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DISCO

GÁL/ELGAR: CONCERTOS PARA VIOLONCELO * * *
Antonio Meneses, Northern Sinfonia (Clássicos, R$ 39,90)
Disco histórico, com a primeira gravação de "Concerto para Violoncelo", de Hans Gál, judeu austríaco de vida atormentada (tia, irmã e filho se suicidaram para evitar campos de extermínio nazistas). Dolorosos e expressivos, os duetos do solista exigem o equilíbrio de um intérprete como Meneses. Ótima oportunidade, ainda, para ouvir Claudio Cruz (spalla da Osesp) na regência.

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FILME

GESTAPO * * *
Carol Reed, Lume (R$ 49,90)
O título original, "Trem Noturno para Munique", condiz melhor com esse filme britânico de 1940, em que nazistas sequestram a filha de um cientista tcheco criador de importante artefato militar. Agentes duplos e humor inglês (com dois fleumáticos golfistas tentando fugir da guerra) compõem reviravoltas envolventes, porém distantes do horror real da Gestapo.

manuel da costa pinto

Manuel da Costa Pinto é jornalista e mestre em teoria literária e literatura comparada pela USP. É editor do 'Guia Folha - Livros, Discos, Filmes' é também do programa 'Entrelinhas', da TV Cultura. Escreve aos domingos.

 

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