Mara Gama

Jornalista e consultora de qualidade de texto.

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Mara Gama

Ana Pêgo nasceu no litoral nos anos 1970 e sempre viveu perto da praia em Cascais, em Portugal. Estudou biologia marinha na Universidade do Algarve, no mesmo país, e se tornou especialista em caçar, catalogar, investigar e mostrar seu inventário de "lixo viajado" que dá na praia.

Ancorado numa página do Facebook e criado em dezembro de 2015, seu projeto "Plasticus Maritimus" já foi exposto em feiras e mostras ecológicas em cidades portuguesas e nos Açores. "Criei um nome científico para o plástico que invade o mar e as praias do mundo todo", diz.

Ana começou a catar lixo nas praias em 2011, como "beachcleaner", nome dado às pessoas que fazem limpezas de praia e destinam as coletas à reciclagem.

Com as coletas regulares, passou a se interessar pelo que catava. "Comecei a guardar objetos e a ganhar o gosto pela identificação do que encontrava", conta a bióloga.

Garrafas, tampinhas, canudos, pregadores de roupa, isqueiros, peças de brinquedos antigos, miniaturas, brindes que fizeram história foram sendo separados em coleções.

Ela se tornou uma "beachcomber". "Os 'beachcombers' são caçadores de tesouros. Fazem limpezas, mas se interessam em saber o que são os objetos, de quem eram, de onde vieram, como foram ali parar", conta Ana.

A partir de 2013, começou a usar seus relicários como ferramentas para oficinas ambientais para crianças.

Já encontrou uma boia da pesca americana e um saco de água potável de emergência da Marinha russa. A página na internet tem ajudado a esclarecer dúvidas sobre objetos que coleta e suas origens.

Este ano, Ana espera viajar mais com suas exposições. Em maio, o carro chefe do projeto, a Balaena Plasticus, um esqueleto de baleia de 10 metros feito de 250 garrafas e potes de plástico, em parceria com o fotógrafo Luís Quinta, será exposto no Centro Cultural Belém, em Lisboa.

A seguir, trechos da entrevista:

Você continua a fazer coletas nas praias regularmente?
Ana Pêgo - Sim, sigo fazendo isso. Há épocas do ano em que vou todos os dias, mas nem sempre é possível. Gosto de ir no inverno, de preferência em dias de chuva, para poder ter a praia só para mim.

O que você procura
Gosto de apanhar o lixo viajado, e não aquele o que as pessoas acabaram de abandonar na praia –sim, estamos no século 21, mas às vezes não parece.
E gosto de saber sobre os objetos que encontro. Tenho criado coleções com o intuito de mostrá-las, tanto nas exposições, como nas minhas atividades educativas e palestras.
Para além de encontrar todo o tipo de objetos que usamos no nosso dia a dia, acho interessante saber que tenho coisas que atravessaram o oceano, que vieram dos Estados Unidos e do Canadá –geralmente coisas relacionadas com as pescas. Já encontrei tinteiros provenientes de um contêiner que caiu ao mar perto dos Açores, bonecos monocromáticos que eram brindes de sorvetes e chocolates nos anos 60 e 70. E muitas outras coisas, que podem ter pertencido aos meus pais ou aos meus avós.

O que faz com os objetos que coleta?
Há coisas que ponho no contentor do lixo, outras trago para casa. Chego em casa e ponho as colheitas de molho com detergente, onde ficam de molho um ou mais dias. Depois, passo-as para tabuleiros para secar. Quando estão secos, tenho que organizar e arrumar tudo. Há coisas que guardo para as exposições, outras para os meus ateliês/ workshops que faço com escolas e famílias. Separo tudo. Uma infinidade de objetos... Tampas de garrafa, tampas de caneta, balões, canudinhos, cotonetes, brinquedos, bonecos, boias de pesca, flores de plástico... mas também guardo fragmentos de plástico e algumas coisas maiores que me possam parecer úteis para alguma coisa. Olho para as cores, para as formas...

Quais os principais invasores do mar e como evitá-los?
Primeiro que tudo, devíamos reduzir o consumo, de forma geral. Reduzindo o consumo, estamos a reduzir os resíduos e, por consequência, a minimizar os estragos no planeta (e na carteira).
Quase tudo o que usamos, mais cedo ou mais tarde, vai parar ao mar, tornando-se uma ameaça para a vida marinha. Metade do plástico que usamos diariamente é descartável. É assustador pensar que estamos a usar apenas por alguns minutos objetos que são feitos de um material que é produzido para durar para sempre.
Por isso, sem dúvida que devíamos acabar com os descartáveis: os pratos, copos, talheres e canudinhos de plástico, sacos (sacolas) de plástico. Depois, temos os microplásticos, que são um perigo invisível. São tão pequenos que mal se vê e não são filtrados nas unidades de tratamento de esgoto. Devíamos deixar de usar produtos que têm microplásticos, como alguns esfoliantes corporais e pastas de dentes branqueadoras.
Recusar é o R mais importante entre os Rs da sustentabilidade. Aprender a dizer "não". Ter a coragem e a ousadia de dizer que "não" queremos certos produtos. Devemos ir às compras e tentar vir de lá com o mínimo de embalagens possível. A parte boa é que, muitos destes objetos não são assim tão necessários e outros têm alternativas mais amigas do ambiente.

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