Começou na Folha como repórter da Sucursal no Rio, onde chegou a diretor. Na redação em São Paulo, foi editor de "Cotidiano" e do caderno de política. Foi ainda secretário de Redação da Folha e ombudsman por três anos.
A eterna vigilância
Dois assuntos mexem com os nervos e a paciência dos leitores da Folha: o Oriente Médio e a disputa entre o PT e o PSDB. As campanhas eleitorais parecem dividir o mundo entre tucanos e petistas. A guerra no Líbano, iniciada dia 12, parece dividir o mundo entre árabes e judeus.
A semana que passou foi pródiga em mensagens com críticas e comentários relativos à cobertura eleitoral e à cobertura no Oriente Médio. Em momentos como agora, em que as posições se radicalizam, as páginas do jornal são lidas com lupas.
Já tratei da questão eleitoral em colunas recentes e devo abordar o tema várias vezes nos próximos meses. O ponto hoje é o Oriente Médio, que teve um extenso acompanhamento ao longo da semana passada. Os leitores que escreveram estavam atentos a dois aspectos: a linguagem e o equilíbrio.
A COBERTURA
A análise da cobertura feita pelo jornal a partir do dia 13 e até sexta-feira mostra um esforço de equilíbrio.
Os relatos dos ataques perpetrados pelos dois lados foram publicados sem atenuantes, e o jornal editou artigos e entrevistas que tentaram explicar os motivos da guerra, os interesses em jogo e as possíveis conseqüências com óticas distintas e algumas vezes antagônicas.
Ao longo da semana, o ponto de vista libanês surgiu em várias ocasiões, inclusive com uma chamada na Primeira Página do domingo passado para o artigo do jornalista Rami G. Khouri. O ponto de vista israelense também foi exposto ao longo dos dias, com destaque para o artigo do escritor Amos Oz, com extrato na capa de quarta-feira.
Há um outro aspecto positivo na cobertura: na sexta-feira, a Folha tinha dois jornalistas nas frentes do conflito, um no norte de Israel e outro em Beirute, o que garantia ao jornal mais independência em relação aos relatos das agências internacionais.
O jornal publicou dois editoriais que condenaram tanto a ação do Hizbollah que desencadeou a reação israelense como a desproporção da resposta de Tel Aviv ("Frente libanesa", em 13/7, e "Reação exagerada", em 18/7). Ambos na mesma linha do comentário do secretário-geral da ONU, Kofi Annan: "Os atos do Hizbollah são lamentáveis, e Israel tem o direito de se defender. Mas o uso excessivo da força deve ser condenado".
O "Painel do Leitor" havia publicado, até ontem, 22 mensagens: 12 defendiam os pontos de vista do Líbano ou dos árabes; oito justificavam as ações de Israel, e duas considerei comentários neutros. A desproporção pode indicar um descuido do jornal ou o maior ativismo de leitores pró-árabes.
A linguagem
O outro aspecto é o da linguagem. Por que a captura de um soldado israelense na faixa de Gaza é considerada um seqüestro e a captura de ministros palestinos dentro de seu próprio território, um aprisionamento? Tem alguma razão jurídica que explique a diferença de tratamento?
E como devem ser tratados os libaneses e palestinos que fazem parte de organizações como Hizbollah e Hamas? Terroristas, militantes, resistentes, milicianos? E os ataques contra civis, não deveriam ser classificados todos como atos terroristas -e por isso condenados- independentemente de quem os tenha praticado, se um Estado soberano ou uma milícia religiosa? Quando um Exército entra num país é uma incursão terrestre ou uma invasão?
A linguagem não é neutra. O texto deve deixar claro que o jornal tem um compromisso com uma cobertura isenta. É necessário refletir e repensar o vocabulário que utiliza para a cobertura do Oriente Médio. Não é uma discussão fácil, mas é imprescindível.
Nem sempre os leitores têm razão nas reclamações que fazem. Temas como o Oriente Médio e a disputa entre PT e PSDB tendem às vezes a ofuscar um pouco a razão. Muitas mensagens que recebo vêm de militantes, o que em si não as desqualifica. Mas algumas são grosseiras e nem merecem resposta. Outras, mesmo duras, provocam reflexão.
De qualquer forma, a vigilância dos leitores deveria servir de freio às tentações de parcialidade e alinhamento da imprensa. Nem sempre funciona.
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