Marcia Dessen

Planejadora financeira CFP (“Certified Financial Planner”), autora de “Finanças Pessoais: O Que Fazer com Meu Dinheiro”.

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Juro real é o que interessa

Crédito: Fernando de Almeida/Folhapress Investidor tem que olhar juro real em suas aplicações de longo prazo
Investidor tem que olhar juro real em suas aplicações de longo prazo

Você está preocupado com a redução dos juros, decepcionado com a rentabilidade de seus investimentos, que caiu pela metade em pouco mais de um ano?

Se você respondeu sim a essa pergunta, é porque está pensando em termos de juro nominal, aquele número absoluto que ainda não descontou a inflação, além dos custos e impostos. Esse, de fato, caiu bastante. Em outubro de 2016, a Selic era 14,25%, e, agora, 7% ao ano, menor taxa nominal em 20 anos.

Mas será esse o melhor parâmetro para avaliar seus investimentos e projetar a rentabilidade dos próximos 10, 20 anos? Posso afirmar que não. Suponha que você tenha ganhado 14% em um período cuja inflação foi, também, 14%. Gostou da rentabilidade? Sua riqueza cresceu 14% ou o aumento foi suficiente apenas para repor a inflação do período?

A rentabilidade nominal de 14%, aparentemente elevada, proporcionou taxa real nula, zero. Na verdade, a taxa real líquida, nesse exemplo, foi negativa depois de deduzidos os custos e o Imposto de Renda que incide sobre todo o rendimento nominal.

A taxa de juros real, apurada quando se desconta a inflação, é a taxa que interessa, a taxa correta para medir, avaliar e projetar seu capital no longo prazo.

Repense e celebre, pois essa, a taxa de juros real, continua elevada, generosa, na casa dos 4% ao ano, raramente encontrada em outros países do mundo.

A inflação medida pelo IPCA em 2017 atingiu 2,95%. Com a Selic de 7%, a taxa real é de 3,93%. Com a Selic de 7,5%, antes do corte mais recente e considerando a mesma inflação, os juros reais eram 4,42%.

Em outubro de 2016, com a Selic ainda em 14,25%, a inflação estava em 7,87% em 12 meses e o juro real era, portanto, de 5,91%. Observe que ambas as taxas caíram, mas a taxa nominal caiu muito mais do que a real, que ainda oferece um bom prêmio para o investidor da renda fixa.

Para projetar a rentabilidade dos investimentos no longo prazo, recomendo utilizar uma taxa de juros real de 3% ao ano. Alguém pode achar que é muito baixa, que o dinheiro não "cresce" se projetarmos apenas 3%. Se você pensa assim, reavalie seus conceitos e expectativas.

Projetar a taxa nominal em 10, 20 anos produz um resultado falso, com probabilidade quase nula de acontecer. O montante de dinheiro será maior, mas o poder de compra dele será menor do que você imagina. Melhor ser prudente e usar uma projeção mais realista do que descobrir, muitos anos depois, que o capital acumulado é inferior ao necessário para gerar a renda complementar que você precisa.

Dois exemplos numéricos para demonstrar os argumentos. José e Maria estão calculando quanto precisam investir por mês, em 25 anos (300 meses), para acumular um capital de R$ 1 milhão, necessário para prover renda complementar na aposentadoria.

A premissa deles: taxa nominal de 7% ao ano e real de 3%.

A única e importantíssima diferença entre eles é que José utiliza taxa nominal de 7% (0,58% ao mês), e Maria, taxa real de 3% (0,25% ao mês), para calcular o valor que devem investir mensalmente para acumular R$ 1 milhão em 25 anos.

José calcula que deve investir R$ 1.242 por mês. Maria, que utilizou taxa de capitalização menor, calcula aplicação mensal de R$ 2.242 –R$ 1.000 a mais que José. Qual a diferença entre o milhão de José e o de Maria? Não estamos falando do mesmo milhão, não é?

José, 25 anos depois, terá acumulado R$ 1 milhão, em valor nominal, absoluto. Esse é o valor que aparece no extrato bancário dele. Acontece que cerca de metade desse valor terá sido consumido pela inflação. Uma coisa é a quantidade de dinheiro que temos em mãos. Outra é quanto conseguimos comprar com ele.

Se a premissa da inflação estiver correta (4%), Maria terá R$ 1 milhão com o mesmo poder de compra de 25 anos atrás, quando começou a investir para o futuro. O extrato dela vai apontar um valor nominal, absoluto, muito maior, algo em torno de R$ 1,8 milhão, porque a aplicação financeira terá sido corrigida pela taxa nominal de 7%, a mesma que José usou na projeção dele.

A projeção equivocada de José, que ignorou o impacto da inflação, deve ser corrigida no meio do caminho. Ele terá de acelerar o ritmo dos investimentos para tentar alcançar Maria, que caminha assertivamente rumo ao
objetivo traçado.

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