Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.

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Mariliz Pereira Jorge

Não é do cinema que podem vir os melhores exemplos de que o machismo, o assédio e a violência contra a mulher devem ser combatidos e punidos, mas do futebol.
Num país pobre e iletrado como o Brasil, a grande maioria das pessoas não sabe quem é Harvey Weinstein (um dos executivos mais poderosos de Hollywood, que viu sua carreira derreter após uma série de denúncias seríssimas) ou tem conhecimento do movimento #metoo (que levou milhares de mulheres a falar sobre abuso e assédio).

Mas o povo sabe quem é Robinho e quem é Bruno, para ficar apenas em dois casos de jogadores de futebol envolvidos em crimes relacionados a estupro e ao feminicídio. E é de punições severas, incluindo o fim da carreira desses esportistas, que o debate sobre esses assuntos pode chegar ao lado mais fraco da corda, onde estão as mulheres pobres e com menos escolaridade. As que continuam sofrendo violência enquanto discutimos na internet que não podemos mais ficar caladas.

Não adianta um jogador de futebol ser enquadrado pela lei, mas ser acolhido por clubes de futebol coniventes com a violência, como aconteceu no começo desse ano com o ex-goleiro Bruno, que chegou a ser contratado pelo Boa Esporte e a foi recebido com festa pela torcida.

Robinho, condenado pela justiça italiana, aguarda julgamento em segunda instância, mas se não fosse tão arrogante talvez já estivesse contratado por algum clube brasileiro. Há mais empecilhos financeiros envolvendo o acerto com um time do que problemas relacionados à acusação de ter embriagado uma garota, que foi estuprada por seis homens, incluindo ele mesmo. Fazer sexo com uma pessoa inconsciente é estupro, que fique claro, se alguém tiver dúvida.

Há um ano, quando escrevi sobre o absurdo da contratação do ex-goleiro Bruno, muitas pessoas defenderam que criminosos merecem uma segunda chance. É verdade, mas não é tão simples quando falamos de assassinato. Não dá para transformar em ídolo de torcida, em exemplo para crianças, um homem que matou a ex-peguete e deu para os cachorros comerem.

Crédito: Doug Patricio - 28.set.2017/Brazil Photo Press/Folhapress Robinho em ação pelo Atlético-MG

Ao ler a reportagem da Folha sobre a situação de Robinho e da resistência do Santos em contratá-lo por causa da gravidade do crime, li com alívio os comentários de alguns leitores, que condenam a hipótese do atacante continuar no futebol. "Não é 'problema pessoal' de Robinho. Se ele violentou uma mulher, não merece ser paparicado. Pelo contrário, esse comportamento deveria ser condenado com firmeza. Eu não contrataria pessoas desse tipo", escreveu um deles.

O mundo dos esportes tem sido conivente com casos de violência contra a mulher, acobertando crimes praticados por suas estrelas. Os casos aqui exemplificados não são os únicos, obviamente, mas o desdobramento deles mostra que tanto o público quanto os clubes começam a reagir da única forma possível, com tolerância zero.

É preciso estar muito desconectado da realidade para achar que manter em seu quadro um jogador envolvido em estupro não vai afetar a imagem do time. Outros jogadores deveriam se negar a entrar em campo em tal companhia.

Se Robinho for condenado e banido do esporte, pelo menos no Brasil, pelo menos entre o povão, o impacto disso será muito maior do que dez discursos em Hollywood.

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