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matias spektor

 

30/01/2012 - 07h00

Sem Conselho

O Brasil acaba de encerrar seu último mandato de dois anos como membro rotativo do Conselho de Segurança das Nações Unidas, foro onde se decidem e legitimam as regras do jogo global. Apesar de ter sentado nessa cadeira dez vezes em setenta anos, foi em 2010/11 que o mundo inteiro percebeu.

Durante sua passagem pelo Conselho, o Brasil meteu o pé no acelerador: fez uma proposta para resolver o impasse nuclear do Irã, tentou liderar uma saída para a crise humanitária no Haiti, denunciou a mudança forçada de regime na Líbia e buscou ter opinião na partilha do Sudão. Também tomou a dianteira num país em frangalhos que fala português e precisa de uma missão de paz pela qual ninguém quer pagar, a Guiné-Bissau.

Nunca antes a diplomacia brasileira nas Nações Unidas teve tanto em jogo ao mesmo tempo.

Nesses dois anos houve momentos de enorme pressão: Obama pedindo a Lula para mudar seu voto, Hillary Clinton indo a Brasília para convencer Celso Amorim, Rússia e China em incontáveis horas de discussão com o governo Dilma, o "Washington Post" e a "Foreign Affairs" criticando o Brasil em artigos e editoriais. Em pouco tempo, o Brasil deixou muita gente de sobrancelha arqueada e cabelo em pé.

Você pode aplaudir ou criticar a performance brasileira, mas esse tipo de turbulência é o ambiente inescapável de um país em ascensão. É bom se acostumar.

Sem estar no Conselho, o Brasil de 2012 ficará menos exposto aos holofotes. Em contrapartida, sua voz será menos ouvida. Longe do centro das decisões mundiais, sua influência poderá declinar.

O que fazer para evitar esse cenário?

Primeiro, marcar presença nos influentes grupos informais que trabalham à sombra do Conselho. Lá será possível insistir nas teses da "responsabilidade ao proteger", proposta brasileira para regrar as intervenções humanitárias do futuro. O Brasil ainda não sabe tirar proveito desse espaço, mas pode aprender com o Canadá, que fez disso uma arte.

Segundo, restaurar a imagem do país junto aos povos da Primavera Árabe, maculada na esteira de nossa lentidão e timidez ao condenar os regimes de Gaddafi na Líbia e Assad na Síria. A maneira de fazê-lo é criando um amplo Grupo de Apoio ao processo de paz entre Israel e Palestina --demanda generalizada sobre a qual as grandes potências têm feito pouco e nada, apesar de ser essencial para a estabilidade daquela região.

Terceiro, e mais importante, tirar lições dos sucessos e fracassos desses dois anos de vida no Conselho de Segurança. Sem essa reflexão, perderemos a oportunidade de traduzir a rica experiência acumulada em instrumentos de política externa para amanhã. Esta é uma operação fácil porque envolve apenas os 20 diplomatas brasileiros que trabalharam no Conselho. É simples juntá-los numa praia deserta do Nordeste para conversa a porta fechadas e sem jornalistas durante três dias. É barato trazer especialistas internacionais capazes de oferecer a perspectiva de quem assistiu a tudo de fora. Nenhum governo é bom de introspecção e autocrítica, mas as circunstâncias são excepcionais.

matias spektor

Matias Spektor ensina relações internacionais na FGV. É autor de 'Kissinger e o Brasil'. Trabalhou para as Nações Unidas antes de completar seu doutorado na Universidade de Oxford, no Reino Unido. Foi pesquisador visitante no Council on Foreign Relations, em Washington, e em King's College, Londres. Escreve às quartas, a cada duas semanas.

 

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