É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.
Diplomacia interina
Quando Collor caiu, Itamar sabia estar diante de enormes problemas. Tinha o prato cheio, mas naquele menu faltava um dos ingredientes mais pesados: turbulência vinda do exterior.
Temer está em circunstância adversa. A viagem de Dilma a Nova York pode ser o início de uma longa batalha fora das fronteiras.
Quais são os imperativos diplomáticos do presidente em função durante seu interinado?
A política externa de Temer será posta a serviço de evitar que seu governo imploda antes mesmo de começar. Na prática, isso impõe três prioridades inescapáveis.
Primeiro, Temer vai vender a versão segundo a qual o impedimento ocorreu nos parâmetros da lei e que Dilma, ao denunciar um suposto golpe, sacrifica a imagem internacional do país no altar da militância do PT.
Os instrumentos de Temer nessa batalha são a imprensa internacional, onde ainda não possui porta-voz ou linha de defesa, e os contatos que venha a construir em Buenos Aires e Washington, as duas praças capazes de eliminar a ideia de "golpe" na OEA, no Mercosul e na Unasul. O maior teste desse jogo acontecerá em 5 de agosto, na recepção a chefes de governos estrangeiros na Olimpíada.
Segundo, Temer vai se apresentar ao mundo como piloto em situação emergencial. O campo de batalha é Wall Street e a opinião das consultorias de análise de risco. O instrumento, a agenda microeconômica: o fortalecimento de agências reguladoras, as novas concessões, as reformas pró-transparência nas estatais e o regime do pré-sal. São medidas que não envolvem gastos, enfrentam pouca resistência organizada e podem virar o comentário negativo da imprensa internacional, com impacto sobre o investimento estrangeiro.
Terceiro, Temer vai adotar uma diplomacia que misture elementos da esquerda e da direita, alimentando a ideia de que seu governo vai transcender o confronto dos outrora poderosos PT e PSDB. Isso significa não adotar uma linha pró-americana à la Macri, mantendo agenda intensa na América do Sul e propagandeando uma ambiciosa agenda social. Envolve, acima de tudo, dizer ao mundo que ele tem na manga medidas para sanear a corrupção endêmica.
O lugar para isso é o discurso de abertura da Assembleia Geral da ONU, em 13 de setembro. Collor usou o pódio para renunciar aos explosivos nucleares. Sarney apresentou a nova democracia, FHC a estabilidade financeira e Lula, o fim da fome. Corrupção é o mote da vez.
Temer fará isso viajando pouco, pois cada ausência sua põe Eduardo Cunha no comando. Por isso, a diplomacia interina demandará chanceler e assessor internacional com força e instinto de jugular.
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