Arquiteto e urbanista, é professor da FAU-USP. Em São Paulo, foi vereador, relator do Plano Diretor Estratégico e secretário municipal de Cultura. É autor de 12 livros.
Escreve às terças-feiras.
Sob Temer, a política de cultura foi inviabilizada
Taba Benedicto/Folhapress | ||
Manifestantes contrários à extinção do MinC e ao governo Temer ocupam a Funarte em SP, em 2016 |
Enquanto o governo agoniza, cresce a adesão pelas eleições diretas e as políticas públicas se esfarelam em um ritmo assustador.
Difícil dizer em que área a situação é mais grave. Mas, sem dúvida, a política cultural é simbólica desse desmonte. A cronologia foi rememorada por Bernardo Mello Franco, na coluna de domingo (18).
A tentativa de Temer de extinguir o Ministério da Cultura (MinC), quando assumiu interinamente, em maio de 2016. A forte mobilização contra a medida, que forçou o recuo.
A recusa de seis artistas convidadas, quando o presidente resolveu indicar uma mulher, para contrastar com um ministério inteiramente masculino.
O esvaziamento da estrutura do órgão, sob a gestão Marcelo Calero, cujo maior mérito foi se demitir denunciando o lobby do ex-poderoso ministro Geddel Vieira Lima para aprovar um negócio imobiliário em área tombada.
O vexame do sucessor, Roberto Freire, que contestou o escritor Raduan Nassar, laureado com o Prêmio Camões, o mais importante da literatura em língua portuguesa, para defender Temer. Mas que, após a delação de Joesley Batista, demitiu-se e passou a apoiar a renúncia do presidente.
E, agora, o novo capítulo na desconstrução do MinC, com a demissão do ministro interino, João Batista de Andrade.
Mantido provisoriamente para que o presidente usasse o ministério como moeda de troca, Andrade afirmou que a indicação do novo ministro ocorre como uma roleta entre os aliados do presidente.
Para ele, o ministério está inviabilizado. O orçamento sofreu um corte de 43%. O Fundo Nacional de Cultura, que já teve R$ 500 milhões, está zerado.
O imbróglio em torno da nomeação da diretoria da Agência Nacional de Cinema (Ancine), vinculada ao ministério, mostrou mais uma interferência indevida do governo na cultura.
A Ancine é um órgão de Estado, que regula o setor do audiovisual e a destinação do seu polpudo fundo. Sua diretoria, que tem mandato fixo, deveria ter perfil técnico e não estar sujeita a disputas políticas.
Andrade, após interlocução com o setor, chegou a nomes de consenso, mas o governo enviou outros nomes para aprovação no Senado.
A inviabilidade do MinC era previsível. Quando a democracia é atacada, a primeira área a ser desmontada é a cultura, pois é por meio dela que se forma consciência, espírito crítico e mudança de mentalidades.
Sem condições políticas de extinguir o MinC, Temer o inutiliza, pragmática e institucionalmente, com dois objetivos: torná-lo incapaz de desenvolver a política cultural e usá-lo para negociatas.
A cultura, estratégica para o desenvolvimento de uma nação, se tornou um dos instrumentos para preservar um presidente que perdeu a capacidade de governar.
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