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luiz rivoiro

 

13/06/2010 - 00h01

Meu amigo Mickey Mouse

Alguém aí já foi à Disney? Bem, eu não fui. Ainda. Nem na época que era criança, há mais de 30 anos (Caramba!). Naquela tempo, viajar para o exterior era algo complicado e caro, muito caro. Não havia muitas companhias aéreas voando por aqui, os voos eram escassos e os aeroportos, bem, os aeroportos eram péssimos, como ainda o são. Ainda assim, tive alguns amigos mais abastados que foram à Terra do Mickey no esplendor dos seus 10, 11 anos de idade. E essas viagens geralmente aconteciam nas férias de julho, em pleno verão norte-americano. Quando eles voltavam torrados de sol, cheios de badulaques, suvenires e traquitanas quase-eletrônicas, eram encarados como semi-deuses por nós, simples crianças mortais desbotadas pelo inverno. Nas rodinhas do recreio, ouvia encantado as histórias das montanhas-russas gigantes, telas de cinema inimagináveis, paradas, shows pirotécnicos. Mas, como tudo na vida, o encantamento foi se diluindo até passar. Pelo menos foi o que eu achei que havia ocorrido.

Voar para os Estados Unidos hoje é muito fácil. Claro que há a burocracia e a espera pelo visto, mas, fora isso, tudo rola numa boa. Há voos diários, os preços estão mais acessíveis e as agências oferecem planos que parcelam os custos a perder de vista. Nessa época do ano, somos especialmente bombardeados por uma saraivada de anúncios de pacotes "imperdíveis" para o World Disney. Desarmados, pais carinhosos, somos um alvo fácil. As crianças se alvoroçam, os amigos botam fogo e até a Mãe entra na onda. Ressabiado, tentei resistir. Não gosto de multidões, de filas, de pacotes. Prefiro viajar por minha conta, para lugares que eu escolho na data que eu quero, parando aqui e ali, sem muito rumo. Não acho que seja exigir muito, mas, no caso da Disney, esse meu, digamos, "método" de viajar, não se aplica.

A começar pelo monopólio dos voos diretos para Orlando. Sim, por que se ao menos cinco companhias voam para os EUA, apenas a TAM opera a rota SP-Orlando-SP, limitando o legítimo direito de escolha do cliente. "Ah, mas você pode ir para Miami ou outro lugar qualquer como Dallas ou Atlanta e daí pegar uma conexão...", diriam os mais espertos. "Claro", concordo. Se estivesse sozinho, poderia fazer a conexão até em Karachi se preciso, mas quando se trata de viajar com crianças, creio que as coisas precisam ser facilitadas. Assim, conformado com a restrição aérea, parti para a fase de pesquisa. E tome mais decepção.

A primeira coisa que descobri é que aqueles "pacotes" com preços incríveis e saídas diárias disponíveis simplesmente não existem. Isso mesmo, são virtuais. Quando você liga ou se comunica por email com um agente de viagens demonstrando interesse em realmente fechar o negócio, descobre o mundo real: 1) aquela tarifa aérea não está mais disponível; 2) não há voos na data que você quer; 3) o hotel oferecido não é lá essas coisas, mas por um pouco a mais é possível um upgrade de categoria. O resultado, claro, é o acréscimo de alguns milhares de dólares no seu orçamento inicial. No fim, quando o email retorna com o tal "pacote" ajustado você se dá conta de que, se quiser mesmo ir ao encontro do Mickey, terá de mudar a data da viagem e pagar não aqueles 6, 7 mil dólares iniciais, mas algo em torno dos 10, 11 mil dólares. E é pegar ou largar. Vem lá, no alto da mensagem, em caixa alta em vermelho: "PREÇO EXCELENTE. PRECISA FECHAR ATÉ HOJE ÀS 16H". Bem, como odeio caixa alta e detesto ser pressionado por algo que não seja uma questão de vida ou morte, larguei. Mas isso não significa que desisti.

Ok, admito que até que tentei fazer isso, desistir. Mas não rolou. A Mãe, movida por uma determinação forjada em aço, argumentou que deveríamos tentar outras datas e agências. Quem sabe não aparecia algo satisfatório? No fim, claro, as crianças merecem esse passeio.... Tá bom, mas ainda assim tentei mudar o rumo das coisas. "E se a gente for para a Euro Disney? A gente vai pra Paris, as crianças passeiam por lá, veem as múmias no Louvre e, de quebra, ainda visitamos o parque do Asterix e os castelos do vale do Loire. Não parece bom?" Sim parecia, mas não o suficiente. Nada era páreo para a Disney original, ainda mais depois da inauguração do parque temático do Harry Potter, na vizinha Universal. É, imbatível.

Tentei ainda apelar para a estressante rotina desse tipo de viagem. Uma atração por dia, sete dias, 12 horas por dia. Não é mole. Trata-se de uma gincana daquelas, que exige fôlego, disposição e pernas. Me imagino chegando ao parque logo pela manhã, sendo aos poucos engolido por aquelas hordas de turistas obesos e ensandecidos, tendo meus músculos desintegrados pelo sol escaldante até ser expelido de volta ao hotel no final do dia, semi-morto, como uma sacola de ossos, um fiapo de gente, para uma noite sem sonhos até a manhã seguinte, quando tudo, inevitavelmente, se repetirá num ciclo aparentemente sem fim. Ufa! Que terror! "Mas quem falou que precisa ser assim?", rebate a Mãe. "Nada disso, a gente faz as coisas no nosso ritmo, sem estresse, que gincana que nada. Relax. As crianças _ e você também _ vão adorar!"

Enfim, meu argumentos não surtiram efeito algum e os planos foram mantidos. Atualmente aguardo orçamentos de três agências para uma possível viagem em outubro ou, que sabe, fevereiro do ano que vem. Isso, se tiver. Se rolar, depois eu conto. Mickey Mouse, me aguarde!

Luiz Rivoiro

Luiz Rivoiro, 42 anos, é pai de João, 8, e de Pedro, 4. Jornalista, trabalhou na "Folha de S.Paulo" por 14 anos. É editor da revista "Playboy" e autor do livro "Pai É Pai - Diário de um Aprendiz". Escreve quinzenalmente para a Folha.com.

 

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