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pasquale cipro neto

 

27/12/2012 - 04h30

'Brasil possui mais de 1 mi de casas...'

Estava na "capa" do UOL, ontem à tarde. O título inteiro era assim: "Brasil possui mais de 1 milhão de casas sem luz, diz levantamento". De imediato, ao ver a forma verbal "possui" (com "i", como é na grafia atual), lembrei que muita gente não escreve "possui", mas "possue", com "e", assim como escreve "substitue", "conclue", "contribue", "atribue" etc.

Experimente jogar no Google as formas que acabo de citar. Os resultados são interessantes. Tomemos como exemplo a incorreta grafia "conclue". O Google dá a dica: "Exibindo resultados para conclui". Como se vê, o Google diz a quem faz a consulta que a forma é errônea, mas, como site de busca que é, oferece a opção pela busca da própria forma errônea ("Em vez disso, pesquisar por conclue"). Quando se clica na forma errônea, ou seja, em "conclue", vem um mar de textos em que se empregou essa forma.

Muitos desses textos, por sinal, são de jornais, sites, blogs de jornalistas etc. A mesma situação se verifica com as outras formas que citei no primeiro parágrafo.

Posto isso, vamos ao xis do problema. Comecemos pela norma ortográfica, simples e clara: a terceira pessoa do singular do presente do indicativo dos verbos que terminam em "uir" se faz com "i" (ele/a possui, influi, retribui, atribui, substitui, contribui, conclui, constitui, prostitui etc.).

Agora vamos ver as possíveis razões desse desvio, que, salvo engano, podem ser duas. A primeira é a associação que o usuário da língua faz com formas como "permite", "assiste", "dirige", "emite", "insiste", que, como se sabe, também são da terceira pessoa do singular do presente do indicativo, de verbos que terminam em "ir" (cuidado: terminam em "ir", mas sem vogal antes do "i"). Qual é a associação que esses usuários fazem? Se de "permitir" se faz "permite" (com "e"), de "substituir" se faz "substitue", também com "e".

Não se faz, caro leitor. De "substituir" se faz "substitui", com "i", o que vale para TODOS os verbos terminados em "uir" (e em "air" também, como "trai", "atrai", "cai" etc.). É claro que o caro leitor não vai confundir "substitui" com "substituí", que é outra história. Trata-se da primeira pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo ("Ontem eu substituí a imagem de fundo da tela do meu computador").

E a segunda razão? Lá vai: as formas "conclue", "substitue", "possue" e afins já foram corretas... Uma das tantas reformas ortográficas do século passado as dizimou, mas, como sempre digo, reforma ortográfica é como garrafa pet (leva cem anos para ser "absorvida"). Não é por acaso que ainda se veem em placas públicas ou em rótulos de produtos industriais formas como "chineza", "irlandez", "holandeza", "baroneza", "zêlo", que já foram corretas e um belo dia foram dizimadas por reformas ortográficas que lhe deram nova "roupagem".

É claro que um dos assuntos deste texto (reformas ortográficas) me fez e faz pensar no que (espera-se) parece iminente: um decreto da presidente Dilma que adiará a entrada em vigor do "(Des)Acordo Ortográfico" e determinará a realização de estudos e debates para a eliminação dos inúmeros problemas do atual texto do "(Des)Acordo". Não é o ideal (que, para mim, seria o puro e simples cancelamento dessa bobagem), mas, por ora, ao que parece, é o possível.

Peço licença, pois, aos que criaram o bordão "Veta, Dilma!" para adaptá-lo: "Assina logo, Dilma!", "Adia logo, Dilma!". É isso.

pasquale cipro neto

Pasquale Cipro Neto é professor de português desde 1975. Colaborador da Folha desde 1989, é o idealizador e apresentador do programa "Nossa Língua Portuguesa" e autor de várias obras didáticas e paradidáticas. Escreve às quintas na versão impressa de "Cotidiano".

 

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