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patrícia campos mello

 

15/04/2011 - 15h46

Um "grão de sal" nas promessas de Pequim

"O presidente Hu Jintao teve uma objetividade que o (Barack) Obama não teve", disse ontem o ministro Desenvolvimento, Fernando Pimentel, ao repórter especial do Valor Sergio Leo. "Com Obama houve empatia, mas não resultado; com Hu Jintao não se criou aquele clima familiar, mas teve resultado", disse Pimentel em Pequim ontem.

É um bom balanço dos contatos da presidente Dilma Rousseff com os líderes dos dois países --a potência da velha-guarda, os EUA, veio com poucas ofertas estratégicas, e a potência em ascensão, a China, encheu os olhos dos brasileiros com números portentosos.

Mas, como diriam os americanos, é bom encarar as promessas chinesas "com um grão de sal", ou seja, ceticismo faz bem. Quando veio ao Brasil em 2004, Hu Jintao prometeu mundos e fundos --cooperação absoluta para a Embraer vender aviões na China, investimentos de dezenas de bilhões, abertura para carne bovina, suína e de frango.

A realidade, como se viu, foi bem mais modesta. Até o fim de 2011, só frango brasileiro entrava em quantidades significativas na China. A Embraer estava quase fechando as portas de sua fábrica chinesa. Os investimentos bilionários demoraram a deslanchar e, quando saíram, limitavam-se a compras em setores estratégicos para Pequim, como minérios, sem muita agregação de valor.

A atual visita reverte um pouco dessa desconfiança. No caso da Embraer, duas companhias aéreas chinesas anunciaram a compra de 35 aviões EMB 190. Aparentemente, a Embraer foi autorizada pelas autoridades chinesas a começar a produzir no país os jatos executivos Legacy 600, evitando o fechamento da fábrica.

Gestos semelhantes aos que Hu fez aos EUA em sua visita a Washington, em janeiro. Lá, ele assinou finalmente uma empacada compra de 200 jatos da Boeing, no valor de US$ 19 bilhões

Hu abriu finalmente o mercado chinês para compra de carne suína. Mas só autorizou a venda da carne de três frigoríficos. Caso se mantenha o ritmo da burocracia chinesa, vai demorar muito até que seja credenciado um número suficiente de plantas para exportar. Ou seja, as exportações podem se manter simbólicas por muito tempo.

Outras questões cruciais ficaram para a reunião da Cosban, no segundo semestre --que, está certo, antes nem conseguia se reunir, então já é um avanço.

"Trataremos das questões como as tarifas contra produtos manufaturados brasileiros, investimentos brasileiros em siderúrgicas chinesas e outros temas pontuais", disse o chanceler Antônio Patriota.

O tal investimento da Foxconn de US$ 12 bilhões --que, de resto, só foi confirmado pelo governo brasileiro, e não pela própria empresa-- causa estranheza. Seriam contratados 100 mil empregados, sendo que o setor inteiro emprega 175 mil no Brasil. O valor também gerou desconfiança --US$ 12 bilhões são equivalentes a quatro fábricas de semicondutores.

Na seara diplomática estratégica, chineses e americanos se igualaram. Nenhum dos dois apoiou abertamente as pretensões do Brasil a um assento permanente em um Conselho de Segurança da ONU ampliado. Os EUA manifestaram "apreço" pela reivindicação de o Brasil, os chineses demonstraram apoio e compreensão à "aspiração" brasileira. "China e Brasil apoiam uma reforma abrangente da ONU, incluindo o aumento da representação dois países em Desenvolvimento no Conselho de Segurança", diz o comunicado.

Mas, de fato, na comparação com o saldo da viagem de Obama, fica difícil competir. Obama trouxe para o Brasil promessas de financiamento de US$ 1 bilhão do Exim Bank para empresas americanas que queiram entrar na demanda de obras de infraestrutura para a Copa de 2014 e Olimpíada de 2016. Em 2010, os EUA haviam anunciado uma linha de US$ 2 bilhões para fornecedores de equipamentos para a exploração do pré-sal --o que está bem aquém dos US$ 10 bilhões que a China ofereceu em crédito à Petrobras em 2009 e os US$ 25 bilhões do BNDES. Washington nem anunciou uma aceleração na eliminação de barreiras sanitárias a produtos brasileiros como a carne --isso, ao contrário da tarifa sobre o etanol, poderia se beneficiar de medidas do Executivo, não precisa do OK do Congresso.
Os EUA podiam ter caprichado mais.

patrícia campos mello

Patrícia Campos Mello é repórter especial da Folha e escreve para o site, às sextas, sobre política e economia internacional. Foi correspondente em Washington durante quatro anos, onde cobriu a eleição do presidente Barack Obama, a crise financeira e a guerra do Afeganistão, acompanhando as tropas americanas. Em Nova York, cobriu os atentados de 11 de Setembro. Formou-se em Jornalismo na Universidade de São Paulo e tem mestrado em Economia e Jornalismo pela New York University. É autora dos livros "O Mundo Tem Medo da China" (Mostarda, 2005) e "Índia - da Miséria à Potência" (Planeta, 2008).

 

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