Pedro Diniz

Jornalista com formação em comunicação audiovisual pela Universidade de Salamanca (Espanha).

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Pedro Diniz

Crítica à roupa de Anitta explica complexo de vira-lata do país

A cantora brasileira de maior sucesso e projeção internacional foi alvo de críticas por causa das roupas do novo clipe "Is That For Me", lançado na última sexta-feira (13).

"Anitta virou um animal?!", perguntou o youtuber Felipe Neto aos 14 milhões de inscritos em seu canal. "Imagina que horror acordar, abrir o armário para escolher roupa e só ter figurino da Anitta em 'Is That For Me'?", disse uma internauta no Twitter, referindo-se às estampas de bicho, à saia de cipó e ao sutiã, da artista Beatriz Brennheisen, escolhidos pela produção.

Exagerado, colorido e com várias referências à cultura nacional, o figurino do clipe não é diferente do padrão adotado por outras "divas" do pop, como Beyoncé e Lady Gaga –esta por muito tempo desafiou os limites do bom senso usando, por exemplo, uma roupa feita de carne.

Ninguém criticou quando Anitta optou por roupas da alemã Adidas para o clipe de "Sua Cara", filmado no Marrocos e com linguagem similar aos videoclipes internacionais. Mas o fato de ter escolhido o Brasil como objeto de estudo parece ter acendido na audiência o complexo de vira-lata que a moda, maior esponja do comportamento humano, adotou como padrão.

Poucas horas após o fim da temporada, o Minas Trend, evento de moda festa mais importante do país, mostrou como esse complexo de inferioridade influencia na criação e, consequentemente, na forma como nos vestimos.

Sem autocrítica nenhuma, estilistas explicavam à imprensa, pelos corredores da feira de negócios, como o estilo das marcas internacionais serviu de mote para suas coleções.

"É a elegância de Chanel, entende?", disse uma. "Tem um quê de Gucci", confessou outra.

O "tudo que é de fora, é melhor" traduzido por Nelson Rodrigues para explicar o viralatismo nacional nunca esteve tão em voga nas passarelas daqui. Japonismo, "western" americano, "street" nova-iorquino e caricaturas do continente africano são alguns dos temas que devem frequentar as vitrines das grifes brasileiras neste verão.

Até uma parcela de nossa moda praia, em que as agências de exportação apostam como grande diferencial da costura brasileira no exterior, ampliou as modelagens dos biquínis e mostrará referências ao balneário dos Hamptons, em Nova York, nas araras estrangeiras.

Ao mesmo tempo, o jeans brasileiro se torna referência de qualidade para marcas internacionais, as gemas mineiras se consolidam como as mais disputadas pelas joalherias e a indústria cosmética transforma a Amazônia em estratégia de marketing. O Brasil traz de volta todos esses ativos, só que mais caros e com etiqueta "made in algum outro país".

É claro que, em se tratado de moda, é contraproducente e até burro apostar na uniformização do pensamento; mas, enquanto o Brasil for exceção no processo criativo de nossas grifes, o país continuará a estar na moda não por seu estilo genuíno, mas por quão colonizado ele ainda pode ser.

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