É jornalista desde os 18. Cobriu as Copas de 1994, 1998, 2006, 2010 e 2014. Hoje, também é comentarista. Escreve aos domingos
e segundas-feiras.
Pelé vale por dois
Messi marcou três vezes no massacre contra o Valencia, quarta-feira, e alcançou 485 gols na carreira. Cristiano Ronaldo marcou três contra o Espanyol, chegou a 521, e isso produziu manchetes sobre a soma dos gols dos gênios do futebol do século 21. Juntos, chegaram a mil gols no domingo passado –já são 1.006.
A bola não parou na marca do pênalti do Maracanã para eles, nem os jogos de Real Madrid e Barcelona foram interrompidos para darem volta olímpica com a bola consagrada nas mãos. Messi tem 28 anos e fará o gol 500 antes de seu próximo aniversário. Pelé marcou o milésimo aos 29.
É claro que é diferente!
O maior gênio de todos os tempos jogou em outra época. Virou um deus. Ninguém jamais vai recontar a história.
Imediatamente a soma dos gols de Messi e Cristiano produziu a pergunta sobre o número de jogos. Eles jogam menos vezes do que se fazia no passado.
Na temporada 1959/60, o Real Madrid foi campeão europeu, vice-campeão espanhol e da Copa do Rei. Disputou 68 partidas. Em 2014/15, Messi ganhou a Champions e disputou 57 das 60 partidas do Barça.
Não parece muita diferença nesta comparação. Mas contra Pelé...
Em seu ano mais exigente, o Rei entrou em campo 103 vezes, duas a mais do que o Santos! Fez espantosos 127 gols.
A média total da carreira de Pelé registra 0,93 por partida. Messi faz 0,78, Cristiano Ronaldo, 0,67.
Pelé é bem mais do que números. "Era o melhor muito antes de ser e continua sendo mesmo depois de ter sido", escreveu Armando Nogueira.
Comparar é mania de quem é apaixonado por um assunto –música, cinema, futebol... Ninguém precisa dizer que laranja é mais gostoso do que maçã e a maior parte das pessoas tem as duas convivendo na geladeira. Mas é irresistível discutir Pelé x Maradona, Messi x Cristiano Ronaldo, Senna x Piquet...
José Trajano tinha a incrível ideia de transformar esses duelos num programa, que teria até nome: Versus. Hoje existe um aplicativo chamado SportsMatch, onde você pode perguntar quem foi melhor: Pelé ou Michael Jordan? Messi ou Zidane?
Messi é melhor do que Cristiano, mas as imagens diárias flagram todos os seus acertos –e alguns erros. Não ver tudo durante todo o tempo, como na era Pelé, reforçava a divindade. Messi perde pênalti e você sabe disso. A TV ao vivo mata a imortalidade.
No caso dos mil gols, a questão é Pelé versus Messi e Cristiano. São dois contra um.
Não é covardia. É uma comparação sobre épocas, uma espécie de "Meia Noite em Paris", onde sempre vai vencer sua memória afetiva.
Quem tem menos de 18 anos vê Messi e Cristiano Ronaldo destruindo recordes e reforçando a hegemonia de Real Madrid e Barcelona como clubes mais importantes do planeta desde 2009. Quem só viu isso jamais vai aceitar a comparação com Maradona, por exemplo.
Quando é perguntado sobre Messi e Maradona, o técnico do São Paulo, Edgardo Bauza, ressalta que os defensores do passado davam muito mais patadas. Sem dizer com todas as letras, Bauza expressa mais respeito por Diego. Dá a entender que Maradona apanhava mais e, mesmo assim, jogava muito. Fez 345 gols.
Pelé fez 1.283. Ele é o melhor!
Em algumas semanas, Messi vai fazer seu gol 500. O número não diz tudo. Ele não é apenas metade de Pelé.
Livraria da Folha
- Coleção "Cinema Policial" reúne quatro filmes de grandes diretores
- Sociólogo discute transformações do século 21 em "A Era do Imprevisto"
- Livro de escritora russa compila contos de fada assustadores; leia trecho
- Box de DVD reúne dupla de clássicos de Andrei Tarkóvski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade