É jornalista desde os 18. Cobriu as Copas de 1994, 1998, 2006, 2010 e 2014. Hoje, também é comentarista. Escreve aos domingos
e segundas-feiras.
A selvageria não está em Buenos Aires ou Montevidéu. Está no Brasil
Márcio Alves - 13.dez.2017/Agência O Globo | ||
Flamenguistas tentam invadir Maracanã em final da Sul-Americana |
Na terça-feira (12), o Mineirão apresentou candidatura para ser o estádio da primeira final única da Libertadores. Na quarta-feira (13), saiu do páreo. "O Brasil perdeu a chance de ser sede da primeira decisão", diz um dirigente da Conmebol, escandalizado com o vandalismo no Maracanã, em Flamengo x Independiente.
O histórico hábito brasileiro de atribuir a argentinos e uruguaios a selvageria nas competições de clubes da América do Sul transforma-se diante das evidências de que somos mais primitivos.
Logo depois da batalha campal em Montevidéu, em Peñarol x Palmeiras, em abril, Diego Lugano alertou para o que, na visão dos uruguaios, é um problema brasileiro. "Todas as confusões envolvem times do Brasil", disse.
O contra-argumento é Atlético Nacional x Rosario Central, briga no final, em 2016. Mas houve Atlético-MG x Arsenal de Sarandí em 2014, Santos x Peñarol e Argentinos Juniors x Fluminense em 2011, São Paulo x Tigre em 2012, Palmeiras x Cerro Porteño em 2006, São Caetano x América do México em 2004, Corinthians x River Plate e São Paulo x River Plate em 2005...
"Me parece que os brasileiros que vêm à Argentina são mais bem tratados do que os argentinos que vão ao Brasil", diz, de Buenos Aires, o editor da revista El Grafico, Elias Perugino.
O Rio de Janeiro, com seus três governadores presos, tem agravantes na comparação com São Paulo, Porto Alegre e Belo Horizonte. O Flamengo disputou 18 partidas no Maracanã neste ano e registrou tentativa de invasão em quatro (22%). A segunda maior torcida uniformizada do clube, a Jovem, está proibida de ir ao estádio e não tem acesso aos ingressos. A suspeita é que seus integrantes comandam as invasões. Convocam pelas redes sociais.
O antídoto óbvio seria bloquear o acesso ao estádio um quilômetro antes e só permitir a entrada de quem tiver ingresso. Esquema igual ao da Copa do Mundo. A Polícia Militar tem uma desculpa ridícula para explicar por que não faz isso. Diz que o sistema de ingressos carregados nos cartões de sócios-torcedores impede saber se os portadores dos cartões têm ou não o bilhete.
Basta avisar que será necessário o recibo da compra junto com o cartão de sócio para ultrapassar o bloqueio. E bloquear!
Diferente dos clubes de São Paulo, os times do Rio não pagam pelo policiamento. Significa que a polícia carioca não recebe nem o salário, nem o décimo-terceiro, nem a bonificação. É licença para invadir, saquear, furtar, matar.
Neste ano, houve homicídio em frente ao Engenhão, briga generalizada em São Januário e quatro invasões ao Maracanã.
O grupo especial de policiamento dos estádios deveria ser especial, mas não se julga capaz de fazer bloqueio a um quilômetro do estádio para evitar as invasões que se repetem.
Casos assim não têm acontecido em Itaquera, no Allianz Parque, no Morumbi, no Mineirão, nem na Arena do Grêmio... Mas a fama se espalha.
Em Buenos Aires, ninguém precisa saber que o estado do Rio de Janeiro está falido. O que se fala na América do Sul é que, no Brasil, a chegada ao estádio acontece sob gás de pimenta. A selvageria não está em Buenos Aires ou Montevidéu. Está no Brasil.
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