Jornalista formada pela USP, escreve sobre economia e política às sextas-feiras.
Um precedente muito perigoso
O governo Dilma abriu um precedente perigoso na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para ajudar o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT).
Já era esperado que o governo fosse alterar o indexador das dívidas de Estados e municípios. Hoje as dívidas são corrigidas pelo IGP-DI mais juros que variam de 6% a 9%, dependendo do ano do contrato.
O IGP-DI é um indicador ruim, atrelado ao dólar e que não tem relação direta com a receita dos Estados e municípios. Pelas novas regras, a correção será feita pela Selic ou IPCA mais juros de 4% (o que for menor).
É possível argumentar que o governo deveria ter aproveitado o momento para arrancar a reforma do ICMS dos Estados. Ou que a simples mudança do indexador já seria uma mexida na LRF.
"É uma questão de justiça. Não faz sentido a União ter lucro, se financiar à custa dos Estados", justificou Dyogo Oliveira, secretário-executivo do ministério da Fazenda.
Ok. O pleito realmente é justo. O problema é a surpresa que veio junto.
A aplicação da taxa Selic vai retroagir aos contratos a partir de 1996 e os Estados e municípios que pagaram a mais serão compensados pela União.
Para alguns especialistas, a dívida da União pode aumentar entre R$ 30 bilhões e R$ 40 bilhões. A cidade de São Paulo será significativamente beneficiada.
"É muito ruim, porque aumenta a insegurança jurídica no país, reduz o resultado primário do governo federal e abre uma avenida para reivindicações futuras", diz Fábio Giambiagi, especialista em contas públicas.
O artigo 35 da LRF veda a renegociação da dívida dos Estados e municípios. A mudança promovida pelo governo Dilma não derruba o artigo, mas abre uma exceção importante.
E um precedente desse tipo é muito preocupante no Brasil.
É preciso lembrar porque a Lei de Responsabilidade Fiscal foi por muitos anos considerada intocável. Essa lei interrompeu um ciclo muito perverso nas contas públicas brasileiras.
Estados e municípios chantageavam a União a assumir suas dívidas, alegando que o caos se instalaria sem pagamento dos professores ou da polícia, e que a imagem do Brasil no exterior viraria pó se houvesse calote.
Nas palavras de um interlocutor próximo do PT, o governo Dilma tomou uma decisão "pragmática". Era preciso ajudar Haddad, o afilhado político de Lula e Dilma, que está numa situação nada confortável após os protestos.
Mas a que preço? E se essa escorregada fizer ruir uma das conquistas mais importantes do país? É a volta do velho balcão de negócios entre Estados, municípios e União?
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