Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 

rita siza

 

28/09/2012 - 13h19

Ética, responsabilidade e transparência

DO PORTO

O "incidente" do acesso indevido aos ficheiros informáticos do comité organizador da olimpíada de Londres por membros do grupo de acompanhamento brasileiro que esteve na capital britânica para observar as operações praticamente passou ao lado da imprensa estrangeira.

Em teoria, a história --contada em primeira mão pelo colunista da Folha Juca Kfouri-- teria todos os ingredientes de um escândalo internacional, mesmo se de reduzida dimensão. Mas dá ideia que o entendimento generalizado dos editores deste lado do oceano foi de que se tratava de lana caprina: os excessos (de zelo?) dos funcionários brasileiros foram desculpados pelos seus congéneres londrinos com a fleuma típica dos britânicos. Afinal, a informação contida nos ficheiros pirateados, apesar de confidencial, não seria sigilosa ao ponto de não poder eventualmente ser partilhada e o comité do Rio tomou medidas imediatas para resolver o assunto e sancionar os prevaricadores.

Porventura embalados pela onda de boa-vontade motivada pelo sucesso dos Jogos Olímpicos de Londres, os austeros britânicos esqueceram todas as medidas que tinham promovido contra a apropriação indevida ou o uso sem permissão de "material olímpico", relevaram o furto e desvalorizaram o caso. Quase não vi notícias sobre o assunto na tradicionalmente escandalosa imprensa do Reino Unido, o que confesso também me surpreendeu --antes do arranque da competição, fartei-me de ler artigos inflamados sobre a mão implacável do comité organizador, que obrigava os cafés de bairro a retirar as referências às olimpíadas dos seus menus de pequeno-almoço, ou proibia os repórteres fotográficos de registar a evolução dos preparativos do lado de fora da vedação do parque de Stratford. Desta vez, a coisa foi reportada com discrição e sem agitação.

Talvez por causa do ambiente de fim de festa os britânicos não se tenham incomodado demasiado com a "intrusão" do pessoal ligado ao Rio 2016, mas como o Juca Kfouri também divulgou no blogue, este episódio em Londres não foi tão inocente quanto isso e muito menos pode ser menorizado como um caso isolado.

O Comité Olímpico Brasileiro já tinha "digerido" em silêncio uma anterior situação de cópia ilegítima de arquivos informáticos, aquando da realização dos Jogos Pan-americanos de 2007.
As notícias posteriores expuseram um "modus operandi" e uma teia de personagens que não podem ser desqualificadas como meros acasos e coincidências.

As reacções do comité do Rio 2016 e do Ministério do Esporte não podem ser tão vagas. E igualmente mal, o Comité Olímpico Internacional não deve apressadamente tomar o caso por irrelevante.

É certamente bom saber que a actuação destas entidades se pauta "pelos princípios da ética, responsabilidade e transparência", conforme reafirmou o comité, mas dizer isto em resposta a um caso de pirataria é o mesmo que não dizer nada --é óbvio que nenhum desses princípios foi respeitado nesta lamentável situação, nem pelos funcionários envolvidos na cópia dos ficheiros, nem pelos dirigentes que continuam a escusar-se de explicar os detalhes do que aconteceu.

Não sei se os dirigentes esportivos brasileiros, e os responsáveis do COI, entendem (com certeza com alívio) que o caso foi ultrapassado, mas eu cá penso que não foram dadas garantias suficientes para tranquilizar ninguém.

rita siza

Rita Siza é jornalista do diário português "Público", onde acompanha temas de política internacional, com ênfase na América Latina. Do futebol ao pebolim, comenta sobre diversos esportes e dedica particular atenção às Olimpíadas. Escreve aos sábados no site da Folha.

 

As Últimas que Você não Leu

  1.  

Publicidade

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página