Jornalista é secretário de Redação da área de Produção da Folha, onde trabalha desde 1998. Escreve às quintas.
O lobby já está legalizado
SÃO PAULO - Quem pegou fila num pedágio argentino deve ter ouvido: um buzinaço pressiona pela abertura das cancelas. A lei prevê que isso ocorra depois de alguns minutos de espera, mas só o barulho dos usuários a torna letra viva.
A estridência viária dos hermanos é prima das panelas deles e agora nossas. Felizmente, sobretudo para os tímpanos, o método de ação pública que dá sinais de florescer por aqui é mais sofisticado e vai além do duelo binário do impeachment.
A revolução mobile não só nos transformou todos em potenciais gravadores, fotógrafos e megafones ambulantes. Ela criou oportunidades reais de influenciar políticas públicas, tanto na destinação orçamentária quanto na defesa de valores.
Nesse sentido, fechar a avenida é quase coisa das antigas. Mais significativo é cravar uma marca no candidato que bateu na mulher. Usar a fama de ator e reabrir o IML. Dar um rolezinho no shopping para defender que o governo é ilegítimo.
A sensibilidade é muito mais aguda do que antes, o ritmo de decisões, mais acelerado —Temer e seus dois ministros caídos que o digam.
Resulta muito difícil, porém, mensurar o real significado de cada ponto de pressão. Principal ágora da vida digital, o Facebook restringe as possibilidades de pesquisa, o que distorce muito as conclusões. Além disso, essa ação é manipulada por grupos organizados e robôs.
Fora das redes também não é simples. Quanto de fato significa uma ocupação do edifício Gustavo Capanema? Uma sequência de protestos na Virada Cultural paulistana?
Esse tipo de encaminhamento do debate público é nunca perfeito, às vezes injusto, frequentemente raso —mas sempre mais democrático do que quando conduzido por lobistas profissionais no Piantella, restaurante do poder em Brasília.
O vetor resultante desse barulho vem exercendo mais efeito prático até do que o voto. Existe um aspecto de boa notícia aí.
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