É físico com doutorado em economia, ambos pela USP, sócio da consultoria Reliance e pesquisador associado do Ibre-FGV. Escreve aos domingos.
Reformas como a da Previdência são necessárias
Laura Carvalho e eu temos debatido diversos aspectos da reforma da Previdência. Em sua resposta na quinta-feira (23), ocorreram três avanços. A fila andou.
Primeiro, percebeu que não faz sentido empregar a expectativa de vida ao nascer para discutir o tema.
Segundo, notou que as aposentadorias por tempo de contribuição ocorrem no espaço urbano, com benefício maior do que o salário mínimo.
Terceiro, desistiu de argumentar que o excessivo gasto previdenciário do Estado brasileiro —algo que está conosco há décadas— seja consequência de crise econômica, algo conjuntural.
Persistem dois erros factuais. Primeiro, não é verdade que a lei 13.183, de 2015, tenha atacado o problema das aposentadorias precoces. Na verdade, a lei que estabeleceu o critério da soma de idade com anos de contribuição de 85 anos para mulheres e 95 aos para homens agravou o problema.
Continua a haver a aposentadoria precoce —significativamente antes dos 60 anos— com benefício ainda maior. Com a nova regra, por exemplo, uma mulher pode aposentar-se aos 55 anos se comprovar 30 anos de contribuição com aposentadoria integral. Na regra antiga, o fator previdenciário garantia somente 70% do benefício.
Na OCDE, a taxa de reposição agregada —razão entre benefício previdenciário e renda ativa— é de 57% e não se aposenta antes dos 60 anos.
O segundo erro factual de Laura é que a "expectativa de duração da aposentadoria é de 13,4 anos no Brasil e chega a 17,6 anos na média dos países da OCDE". De fato, esse dado consta no relatório "Pensions at Glance 2015", da OCDE, tabela 7.10 à página 165, mas é um dado referente à efetiva saída do mercado de trabalho, e não de recebimento do beneficio (há muitas pessoas que se aposentam e continuam trabalhando). Para o debate em tela, o que importa é o momento em que o benefício é requerido.
Por exemplo, a idade média de aposentadoria, isto é, de requerimento do benefício, de uma mulher por tempo de contribuição em 2016 foi de 53 anos. A duração esperada do benefício, pela expectativa de sobrevida, será de 30 anos, e não 13.
Não há dados oficiais de expectativa de sobrevida com abertura rural e urbana. Segundo a dissertação de mestrado de Márcia Caldas de Castro, de 1997, "Entradas e saídas no sistema previdenciário brasileiro: uma aplicação de tábuas de mortalidade", a sobrevida aos 60 anos no campo era, nos anos 1990, igual à do meio urbano, por volta de 25 anos.
A necessidade da reforma é que o montante do gasto, 13% do PIB, é absolutamente fora de padrão para economias com taxa de de pendência de 13%. Adicionalmente, a dinâmica demográfica levará esse gasto para valores superiores a 20% do PIB. É necessário que a taxa de crescimento do gasto primário da União passe a ser igual à taxa de crescimento da economia. A reforma é um dos instrumentos importantes para estabilizar o gasto primário da União como proporção do produto da economia.
Penso que a discordância que há entre mim e Laura é que eu vejo ligação entre crescimento permanente do gasto primário do Estado acima do crescimento do PIB —tem sido assim nos últimos 25 anos— e baixa poupança, taxa de juros reais elevadas, pressão inflacionária constante e baixo crescimento. Enquanto Laura não enxerga essa ligação.
Laura é mais feliz do que eu.
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