Formada em jornalismo e veterinária. Atuou por 13 anos na Folha. Co-autora de 'Medicina Felina Essencial' (Equalis) e 'A Caminho de Casa' (Ed. de Janeiro). Escreve aos domingos.
Cheiro, logo, existo
Os cães pensam? Se pensam, como encadeiam pensamentos? Como nos veem? O que faz com que se lembrem de nós e nos reconheçam? Somos, cada um, um somatório de cores, um tom de voz, uma forma única de movimento ou um cheiro?
Inúmeros grupos de pesquisa têm buscado essas respostas e, ao que tudo indica, o olfato é o grande maestro do mundo canino. Já usamos essa característica a nosso favor, delegando ao faro dos animais a detecção de bombas e de drogas, mas pouco sabemos sobre como tais estímulos orientam o comportamento diário de nossos mascotes.
Outro dia, o "Globo Repórter" reproduziu surpreendentes imagens da BBC sobre a rotina de Fern, um cão treinado para encontrar corpos de pessoas afogadas. Fern tinha de localizar uma lata de carne escondida no imenso lago Castlewellan. Em minutos, ele conseguiu.
O segundo personagem da reportagem da TV inglesa era Jazz, cão da raça vizsla. Câmeras espalhadas pela casa mostraram que todos os dias, às 16h40, cerca de 20 minutos antes do dono chegar, ele pulava no sofá e ficava olhando para a janela.
Ilustração Tiago Elcerdo | ||
Johnny, o dono de Jazz, tem certeza de que o cão sabe o horário em que ele chega em casa. Ele e muitos de nós. Mas como eles fazem isso?
A principal teoria é a do enfraquecimento do cheiro ao longo do dia. Pela hipótese, quando o odor cai a um certo nível, Jazz percebe que está na hora de Johnny voltar.
A equipe testou a hipótese e pediu à mulher de Johnny que, no meio do dia, levasse à casa uma camiseta que ele acabara de usar. Naquela tarde, Jazz dormiu profundamente até seu guardião retornar.
A história é sem dúvida um indício a favor do olfato como relógio biológico canino. Mas como explicar que um cão chore na porta do apartamento, no décimo andar, quando um membro da família ainda está estacionando na garagem, em horário completamente imprevisível? Superolfato? Superaudição? Ou formas de apreensão do ambiente que ainda estamos longe de entender?
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