Formada em jornalismo e veterinária. Atuou por 13 anos na Folha. Co-autora de 'Medicina Felina Essencial' (Equalis) e 'A Caminho de Casa' (Ed. de Janeiro). Escreve aos domingos.
Obrigada, Pompom
Ele vomitou e caiu no meio do jardim. Tivemos que buscá-lo fazendo do cobertor uma maca. Não se mexia, tinha um nível mínimo de consciência, e as mucosas estavam completamente sem cor. Parecia um pesadelo: Pompom, o cara mais legal do mundo, estava partindo.
A reta final começara três meses antes, quando Pompom brigou com Lula, nosso pastor alemão, e rompeu o baço. Foi operado às pressas e a cirurgia revelou que o órgão estava fragilizado pela presença de um tumor bastante maligno. Pelos artigos científicos, a expectativa de vida desses pacientes é de 19 a 60 dias.
Era o início de nossa corrida contra o tempo e contra o inevitável. Exames semanais, sucessivas transfusões de hemácias, plasma, plaquetas, o que ele precisasse. Foram muitas manhãs, muitas tardes, muitas noites tentando. Mas o câncer se espalhou, e Pompom sucumbiu a uma entre várias hemorragias.
Já faz um mês que meu velho pit bull nos deixou, mas a dor me impedia de tocar no assunto. É dor física mesmo: um nó na garganta, um buraco no estômago, uma sensação de que falta uma parte de mim.
Minha vida mudou e cabe só a mim decidir que não seja para pior.
Tiago Elcerdo | ||
Desde que Pompom partiu podemos abrir sem receio as portas da varanda, pois não há mais risco de haver briga. E os outros membros da matilha, que antes não entravam em casa, agora circulam livremente pela sala ou pela cozinha.
Para eles, foi renovador. Bebê, a velha golden retriever (sim, são todos velhos), parou de lamber compulsivamente a pata e se livrou do colar, pois agora ganha muito mais carinho. A poodle Sarah está inacreditavelmente mais calma, e Protegilda, a vira-lata mais linda do mundo, a cada dia menos medrosa. Até Lula, o briguento com dois tumores na cabeça, parece mais alerta com a chance de explorar novos ambientes.
Pompom tinha muito medo de raios e trovões, o que me deixava tensa quando o céu começava a fechar. Mas, desde que ele partiu, eu perdi o meu medo da chuva.
Pompom me deu várias lições, e a última delas foi que até os piores momentos da vida têm um lado bom. Mas a gente precisa querer ver.
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