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sylvia colombo

crônicas de Buenos Aires  

29/11/2011 - 07h00

Notas mexicanas

Passaram-se apenas dois dias do início da 25a edição da Feira do Livro de Guadalajara (que vai até o próximo domingo), no México, principal encontro do mundo das letras em espanhol. Algumas figuras, porém, já se destacaram.

Fernando Vallejo, o autor e o homem

O colombiano Fernando Vallejo ("A Virgem dos Sicários"), conhecido por seus violentos ataques a governantes, Igreja, família e todo o povo colombiano, não foi menos agressivo na FIL, onde ganhou prêmio.

Em seu discurso, entre uma e outra frase de efeito que provocava "ahs..." e "ohs..." na plateia, atirou contra o presidente conservador mexicano Felipe Calderón (Partido da Ação Nacional), que iniciou uma guerra contra o narcotráfico que já deixou 40 mil mortos. Disse que o México está ficando parecido com a Venezuela, comparando o perfil autoritário de Calderón com o de Hugo Chávez.

Mas, curiosamente, o escritor que diz que a Colômbia vai afundar por culpa da ignorância e do comportamento moral dos próprios colombianos e que se preocupa mais com animais (doou parte do prêmio a associações protetoras) do que com as pessoas, no trato particular se mostra um homem doce e divertido.

Em almoço para convidados, sorriu, conversou com todos, fez piadas e não parecia nem um pouco o sujeito amargurado das páginas de "El Desbarrancadero", em que conta a agonia e a morte de seu irmão, vítima da AIDS.

Tristeza de Herta Müller

Contrastando com a alegria de Vallejo, os convidados da festa se impressionaram muito com a tristeza e o aspecto encurvado e sombrio da Nobel romeno-alemã Herta Müller.

Suas declarações sobre vida pessoal e literatura causaram impacto por sua dureza e as expressões faciais que as acompanhavam _olhos vermelhos, postura encurvada, tom de voz dramático.

Müller, que cresceu numa vila na Romênia durante a ditadura de Nicolae Ceausescu (1965-1989), falou sobre o drama de tentar entender o pai, que foi oficial nazista (leia na Ilustrada de hoje).

Algumas de suas frases:

"Quando era jovem, ia cuidar das vacas, que era minha tarefa. Mas pensava que as vacas não precisavam de mim. Eu sentia uma imensa solidão. E até hoje não posso olhar paisagens, cenas campestres, me dão uma tristeza imensa."

"Os livros foram me ensinando como viver, pois muitas vezes a vida me parecia insuportável."

"Não gosto de estar em público. Não gosto de estar assim, exposta diante de todos. Preferia que, quando saísse nas ruas, as pessoas não soubessem quem eu sou", disse, para uma plateia lotada, que parecia então subitamente constrangida.

Para tentar quebrar o gelo, o jornalista espanhol Juan Cruz, que mediava o evento, disse: "Herta, você aqui não está em público, está entre amigos". A romena sorriu com o canto da boca, não parecendo nada convencida.

Colombianos no México

Pergunto a um jornalista colombiano por que escritores tão importantes de seu país, como Gabriel García Márquez e Fernando Vallejo, uma das estrelas da FIL, preferiram ir embora da Colômbia e se fixaram no México.

"Por razões diferentes, mas por conta do mesmo agente, a sociedade conservadora de Bogotá", disse.

García Márquez, que veio da região costeira (Aracataca) nunca foi inteiramente aceito por Bogotá. As cenas de rechaço dos colegas do colégio, contada em sua autobiografia ("Viver para Contar"), o acompanhariam até hoje.

"O que ele retrata é o espírito e a forma de ver o mundo da costa colombiana, na verdade o realismo mágico não é nada mais do que uma imagem da vida nessa região. E as pessoas das grandes cidades nunca aceitaram que essa fosse a ideia da Colômbia projetada para o exterior."

Já Vallejo sempre foi muito duro com os colombianos, atirando contra tudo, da moral à religião, não poupando nem o vallenato (gênero musical popular no país).

"Não era mais possível que continuasse lá. É certo que seus ataques são exagerados e violentos, mas a verdade é que ele coloca o dedo nas feridas que realmente existem na sociedade colombiana."

Novos autores

Guadalajara está dando, neste ano, grande espaço para a literatura de novos autores do continente. Além do projeto "Os 25 Segredos Melhor Guardados da América Latina", que reúne autores de Venezuela, Equador, Peru, Costa Rica, Bolívia, Argentina, Uruguai, Chile e outros, alguns jovens têm tido especial atenção.

É o caso do colombiano Carlos Granés, que recebeu o prêmio de ensaio Isabel Polanco, oferecido pelo grupo Santillana, com o livro "El Puño Invisible". Nele, o antropólogo de 36 anos analisa a influência das vanguardas do século 20 sobre a cultura popular dos dias de hoje. Está sendo bastante festejado.

Candidatos na feira

A política está presente na FIL, e a campanha eleitoral para as eleições do ano que vem, para presidente, marca algumas discussões. Candidatos também terão voz.

Hoje, apresenta seu livro, "Nuestra Oportunidad. Un México para Todos", a aspirante do PAN, Josefina Vázquez Mota. No sábado, o candidato do PRI (Partido Revolucionário Institucional), Enrique Peña Nieto, por enquanto favorito nas pesquisa, faz a conferência "Por um Acordo Nacional para Promover o Desenvolvimento".

Vargas Llosa encontra o iPhone

O Nobel peruano, figura mais festejada do evento, como sempre muito amável e generoso nas declarações e no trato com os que o cercam, começou a se irritar no meio da tarde de domingo com a imensa quantidade de gente que queria tirar fotos com ele.
Pelo visto, autógrafos agora estão definitivamente fora de moda. Não vi ninguém com o bom e velho bloco ou guardanapo de papel. "Todo mundo tem esses aparelhinhos, você aparece e nem olham direto para a sua cara já levantam essa maquininha e começam a fazer fotos. Estão todos viciados", reclamava.

A jornalista Sylvia Colombo viaja a convite da organização do evento

sylvia colombo

Sylvia Colombo é correspondente da Folha em Buenos Aires. Está no jornal desde 1993 e já foi repórter, editora do "Folhateen" e da "Ilustrada" e correspondente em Londres. É formada em jornalismo e história. Escreve às terças-feira no site da Folha.

 

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