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sylvia colombo

crônicas de Buenos Aires  

03/07/2012 - 07h00

México, passado e presente

Encontro o escritor Juan Villoro no café do hotel Majestic, de cara para o Zócalo, a maior praça da Cidade do México. No coração do centro histórico da capital do país, o Zócalo é um ponto de encontro dos mexicanos desde antes do século 14. Era um local em que os astecas realizavam cerimônias antes da chegada dos espanhóis à então chamada Tenochtitlán, a cidade mais importante das Américas naquele tempo.

A partir da conquista, o Zócalo virou o centro nervoso da colonização espanhola na região. Contruíram-se aí vários prédios importantes, que ainda estão de pé, como a Catedral e o Palácio Nacional. Este último tem como decoração os incríveis murais de Diego Rivera (1886-1957) que contam a história do país, suas lutas e os povos que o formaram. Por essa construção, por muito tempo, passaram vice-reis e governantes que tomaram as principais decisões quanto ao futuro da região.

Villoro vem de filmar parte de um documentário sobre o período pré-colombiano. Decepcionado com a volta do PRI (Partido Revolucionário Institucional) ao poder, no México, diz que prefere, num momento como este, se refugiar no passado milenar de seu país.

Nas ruínas do templo asteca que está explorando, destruído pelos espanhóis, Villoro presenciou as novas escavações que se fazem no local. O arqueólogo Eduardo Matos Moctezuma, que ironicamente carrega o nome do último líder da cidade sob domínio asteca, é o responsável pela investigação do passado do Zócalo e leva adiante a tarefa de fazer arqueologia num lugar extremamente movimentado e vital deste centro urbano. Atualmente há mais de cem investigações históricas acontecendo ao mesmo tempo no centro da Cidade do México, uma verdadeira referência em termos de arqueologia urbana mundial.

Cada país tem seu modo de relacionar-se com a história. No México, ela é um elemento tão vivo quanto a própria morte, tão celebrada em canções, imagens, e imensas festas.

O modo como o passado está disposto na organização da cidade faz com que seja impossível não topar com ele. As principais referências urbanas são símbolos históricos.

O Paseo de la Reforma, artéria vital da cidade, liga o monumento Ángel de la Independencia, que celebra a emancipação, à Plaza de la Revolución, onde está o imponente museu que celebra os heróis da Revolução de 1910. Na ocasião, um grande levante armado camponês terminou com o governo do autoritário Porfírio Díaz. Ao lado da Revolução Cubana, é um dos episódios mais marcantes da história da América Latina no século 20. Pois do alto do monumento em homenagem à data, pode-se observar todo o centro dessa suntuosa cidade.

A partir da Plaza de la Revolución, através da avenida Juárez (um herói da consolidação do México como República), chega-se ao Zócalo. Já saindo do Ángel de la Independência e indo na direção contrária, atinge-se o Museo Nacional de Antropologia.

A instituição teve sua coleção iniciada ainda durante o vice-reinado espanhol, no século 18. Primeiro com sua sede no centro histórico, agora está localizada no meio de um lindo parque. Um dos pontos altos de sua trajetória foi a chegada do grande monólito de Tláloc, trazido da comunidade de Coatlinchan, em 1964. Hoje, é essa grande estátua de pedra quem dá as boas-vindas ao visitante.

No museu estão importantes peças dos passados maia, asteca e dos outros povos que existiram na região antes da chegada dos espanhóis. Uma de suas principais peças é a Piedra del Sol, erroneamente chamada de Calendário Asteca. Turistas fazem fila para tirar fotos com o famoso ícone atrás, ainda que sua função não tenha sido de todo decifrada até os dias de hoje.

Um dos méritos do museu é o de não adotar uma visão maniqueísta da Conquista espanhola. Ao contrário, faz todo o esforço para contextualizá-la. A história que conta não é a de bons contra maus, e as ações dos povos indígenas contra outros é explicada de forma clara e imparcial. Não há um ranço anti-espanhol nem leituras parciais de eventos, batalhas e conquistas.

É um lugar-comum o comentário de que a Cidade do México é uma urbe caótica e de trânsito infernal. É certo que, nos horários de pico, andar de carro por suas ruas e avenidas é um horror, e fazem com que venham à memória as tardes de chuva na marginal Pinheiros ou o inferno de transitar no centro de Caracas durante qualquer hora do dia.

O que pouco se diz é que é uma cidade que está desenhada de forma harmoniosa, diferente de São Paulo. E que dá lugar a seus habitantes. No domingo de manhã, por exemplo, as vias do centro são abertas para os ciclistas e os pedestres, e fechadas aos carros.

Também não se comenta sobre esse desenho urbanístico, em que a cultura e a história jogam papel fundamental e dão identidade à cidade. O trânsito, num contexto destes, fica mesmo para um segundo plano.

sylvia colombo

Sylvia Colombo é correspondente da Folha em Buenos Aires. Está no jornal desde 1993 e já foi repórter, editora do "Folhateen" e da "Ilustrada" e correspondente em Londres. É formada em jornalismo e história. Escreve às terças-feira no site da Folha.

 

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