Tati Bernardi

Escritora e roteirista de cinema e televisão, autora de “Depois a Louca Sou Eu”.

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Tati Bernardi

Luta de classes.com

Essas eleições trouxeram à tona, principalmente nas redes sociais, muito mais do que a famigerada luta entre burguesia e proletariado. Hoje temos, no mínimo, umas dez classes se digladiando por mais atenção, "likes" e ofensas:

O vim, vi e se vira: ninguém ajudou esse vitorioso. Ele saiu lá de Pirapora Mirim do Passa Quatro e hoje tem casa própria e máquina de fazer macarrão. Ele é filho de uma boleira e de um professor. Sua frase preferida é "tu-do-so-zi-nho". Só tem duas coisas que ele odeia mais que playboy e presidente playboy: o assistencialismo e os assistidos.

O aristocrata culpado: a babá era trilingue, e a cozinheira entende de harmonização com rosé. Mas ele, assim como Buda, andava angustiado e resolveu produzir obras (filmes, pinturas, fotos) falando (acerca) da pobreza e da violência e, sobretudo, da violência quando o assunto é pobreza.

O playboy de santo: ele estudou sociais, usa papete, tem vinil do Bezerra da Silva, toma pinga. Ele é massa, mas... tá possuído. Vez ou outra baixa nele um Pai Branco do Itaim-Bibi. E, de repente, aquele rapaz de Hering amarelada no sovaco aparece com uma Pajero. Tem lá um adesivo da Dilma, mas... gente, é uma Pajero.

A namorada do cara com barco: ela não quer se meter, ela preferia falar dos ipês coloridos do condomínio ou do bazar "quinquilharias de ricas". Mas o namorado é Aécio na cabeça e colou um adesivo no barco. E ela, porque tava um fim de tarde bonito, saiu fazendo um V da vitória, posando com o barco.

O All Star esquizo: ele quer ser artista, mas... como é bom o dinheirinho que ele ganha trabalhando com publicidade ou com mercado financeiro ou qualquer coisa ali por perto da ponte Cidade Jardim! Mas ele quer ser artista. Mas como é bom o dinheirinho que ele ganha. Mas, ops, artista vota nessa sigla aqui. Mas...quem paga esse meu dinheirinho bom vota nessa sigla aqui. Ops, ele não sabe opinar. Não, ele sabe, sim: vocês são chatos!

A gatinha sangue bom: ela é zona sul, namora gatinho zona sul vistão, mas mora num prédio cheeeeeio de artistas que amam pobre; daí agora ela curte pobre porque quer andar com os artistas. E, de andar com os artistas, acabou gostando de gostar de pobre e, por consequência, gostando de pobre. Daí ela ficou ainda mais sangue bom (só que menos gatinha porque amadureceu).

O replicador de pai burro: é aquele que tem medo de pegar tétano se andar fora de sua bolha com ar-condicionado e acredita mesmo em meritocracia ("pô, meu, se eu me matei de estudar pra ganhar aquele carro e ganhei, esse esquema de merecer é muito irado!"). Quando alguém pergunta sua opinião, ele cita o papy: "Bom mesmo é quando tinha a Rota" ou "borracha neles".

A falsa feia por opção: ninguém nunca a assediou. Mas ela é muito contra todos os assédios que ela poderia sofrer e daí fica parecendo que é opção dela (e não um feito da natureza) fazer uma cara bem feia a ponto de não ser assediada. Ela é capaz de matar o primeiro desgraçado que a assediar. De amor.

O garoto pôster/colchão: quem nunca se apaixonou por um garoto que só tem um colchão no chão e um pôster do Che Guevara numa parede com umidade? Você o conheceu naquele bar cheio de pomba e pastel, mas, só depois que já estava nua, descobriu que o poeminha era do Leminski. O avô não aguenta mais a década sabática do gênio entorpecido e o deixou de castigo. Boa parte do que ele pensa é pensata.

A cronista publicitária querendo ser aceita pelos jornalistas: ela corta com o Proença, tem personal e já saiu no "Glamurama". Alguém inventou de lhe dar uma coluna num caderno de eleições e, apesar de sua ignorância, ela tenta gracejos. Seu voto pode ser declarado em forma de charada: tá mais pra Vila Madalena que pra Jardim Europa. Ela nasceu na ZL e entende, no esôfago, o que alguns só entendem no mestrado.

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