Está na Folha desde 1991.
Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.
Estiagem de dólares
As entradas de dólares no país não andavam tão murchas desde a crise de 2008-09 ou, antes disso, desde 2003, ano de rescaldo dos tumultos derivados do fim do governo FHC e da eleição de Lula.
Não é situação nem de longe tão dramática quanto a de 2009 e menos ainda quanto a de 2003. Não deixa de ser, porém, um incômodo e um sintoma de desarranjos. Seria prenúncio de coisas piores ou apenas o fim de um ciclo de descrédito agudo do Brasil?
Trata-se aqui do fluxo cambial, o balanço de entradas e saídas de dólar do país. Até dezembro, o saldo acumulado em 12 meses era negativo em US$ 9,3 bilhões. Em janeiro, o saldo é negativo em US$ 1,3 bilhão.
A mais recente temporada de vacas magras ficou evidente lá por março de 2013, quando começaram os paniquitos devidos ao risco de alta de juros nos EUA. Nesse período de seca, o saldo chegou a ficar negativo em US$ 20 bilhões, em maio de 2014 (acumulada a conta de 12 meses). Não foi tão ruim quanto abril de 2009 (rombo de US$ 80 bilhões). Mas incomoda.
Os donos do dinheiro voltarão com dólares assim que a economia brasileira voltar a fazer sentido, com os economistas de Dilma 2 pondo ordem na casa (voltariam para se aproveitar dos nossos juros aberrantes)? Ou antecipam o tumulto que virá com a alta de juros nos EUA? Ou se trata de prenúncio de coisa pior, seca ruim de capital externo?
Um fluxo cambial negativo duradouro, como o de agora, pressiona o preço do dólar. O fluxo negativo resulta de uma indisposição estrangeira de financiar nosso deficit externo (nosso excesso de consumo no exterior), de desconfianças sobre o futuro do crescimento da economia e da nossa incapacidade de voltar a exportar bem.
Em outros tempos da última década, a entrada minguante de dólares pelo canal "financeiro" era compensada pelo saldo comercial. Agora, não. O saldo comercial, exportações menos importações, baixou a zero.
Dólar em alta pode ser um sintoma e um remédio. Sintoma de excessos de consumo e erros de política econômica. Um remédio que pode, em tese, melhorar a venda da indústria e compensar a redução do preço das commodities que exportamos. Causa o efeito colateral da inflação.
O que pode vir pela frente?
O Investimento Estrangeiro Direto, IED, vinha se mantendo em níveis razoáveis, embora não fosse mais bastante para financiar nosso deficit externo (IED é o investimento "na produção", em novos negócios, ou empréstimos entre matriz e filial). Com a expectativa de mais um ano de crescimento zero e um 2016 de crescimento fraco, vai se sustentar?
Os donos do dinheiro grosso aqui do Brasil ainda estão ressabiados, o que pode ser uma pista vaga para o comportamento dos investidores "não residentes".
O termômetro da confiança são as taxas de juros na praça financeira, cobradas entre bancos, negociadas entre grandes investidores e cobradas do governo. Grosso modo e dado o desconto da alta de juros "do BC" do início de dezembro, estão mais ou menos no mesmo nível dos dias da reeleição de Dilma. Ora dão uma subida, ora caem.
O bode sai da sala e volta de acordo com a confiança do "mercado" de que a nova política econômica vai pegar no breu ou não.
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