Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Pé-direito alto, teto baixo

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Michel Temer decidiu então mandar ao Congresso a versão extrema dos planos de limitar o crescimento do gasto do governo federal, o chamado "teto". Durante 20 anos, de 2017 a 2036, a despesa anual será apenas reajustada pela inflação do ano anterior, norma que seria inscrita na Constituição.

Na prática, o gasto não vai crescer em termos reais. Será congelado. Mas há previsão de "liberdade condicional" para o aumento de despesa, a partir do décimo ano, se assim governo e Congresso decidirem.

Não é apenas um plano de tapar o rombo das contas do governo ou de racionalizar gastos etc. É um projeto de redução do Estado.

Convém prestar atenção:

1) Lá pelo nono ano, 2025, a despesa deve ficar perto de 16,5% do PIB, caso se aceite o chute razoável de que o PIB deva crescer pela média dos últimos 20 anos antes da recessão horrenda;

2) O gasto está agora em pouco mais de 19% do PIB (desconsideradas as "despedaladas"). Esteve em torno de 16,5% do PIB entre 2006 e 2008, basicamente Lula 2 antes da crise e da virada da política econômica. Note-se que um pedação do aumento do gasto de Dilma se deveu a subsídios e favores para empresas;

3) O gasto com saúde e educação não crescerá de acordo com o aumento da receita, como era o caso até agora, por lei (na verdade, lei nova previa aumento ainda mais rápido de gastos com a saúde). De 2017 em diante, essas despesas seriam reajustadas apenas pela inflação (isto é, em termos reais, não aumentam nem diminuem). Podem até crescer mais, desde que se corte gasto em outra área;

4) Ainda não há definição sobre como conter o crescimento de quase 50% da despesa federal (Previdência e outros benefícios sociais indexados ao salário mínimo). Se essas despesas continuarem crescendo, outras terão de ser comprimidas;

5) O governo ainda nada disse sobre meta de redução de deficit. Por ora, o deficit primário como proporção do PIB será tanto menor quanto maior for a receita, dado que a despesa estaria congelada. Pelas estimativas ora mais razoáveis, haveria deficit até 2020 ou 2021, caso a receita cresça no ritmo do PIB e caso não venha aumento de impostos. Lá pelo nono ano, haveria superavit primário de perto de 1,5% do PIB;

6) Quanto mais cedo vier o superavit, mais fácil derrubar os juros. Para tanto, seria preciso aumentar impostos. Não se ouve um pio ainda sobre o assunto;

7) Preste-se atenção ao "nono ano". É a partir daí que o gasto pode ter "liberdade condicional", como se disse, e foi até aí que o Ministério da Fazenda divulgou projeção própria para o gasto federal: cairia então a 16,8% do PIB. É o ano em que parecem de olho;

8) O programa será menos doloroso caso se aumente a eficiência do gasto social e se faça uma racionalização geral na administração pública. Ainda não há notícia de que o governo esteja pensando nisso, em fazer "mais com menos";

9) O Congresso terá de fazer Orçamentos mais realistas. Atualmente, a cada ano se dedica à picaretagem de inventar receitas de fantasia a fim de acomodar gastos à vontade. Agora, haveria um "teto": se aumenta ali, tem de cortar aqui (cortar subsídios para empresas e ricos seria urgente, aliás). O conflito sociopolítico ficará mais intenso e explícito.

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