Está na Folha desde 1991.
Em sua coluna, aborda temas políticos e econômicos. Escreve de quarta a sexta e aos domingos.
Brasil, confiar, desconfiando
Mateus Bruxel/Folhapress | ||
Consumidora faz compras em supermercado |
A CONFIANÇA do consumidor voltou a subir em janeiro. Voltou na verdade para o nível de setembro do ano passado, quando surgiu uma onda de inverno econômico no que, se esperava, fosse o início da temporada primavera-verão. Deu quase tudo errado.
A confiança voltou a baixar. Comércio, serviços e, mais inesperado, indústria levaram tombos feios.
Esperava-se que o PIB deixasse de cair no trimestre final do ano. Depois da estagnação, a economia voltaria ao azul, mesmo que desmaiado, neste início do ano. Não deu nada certo.
Não se sabe muito bem o que aconteceu, assim como ainda se desconhecem muitas das manhas desta recessão excepcional. Uma hipótese razoável é que a confiança pisava nos astros ou nas nuvens distraída, talvez embalada apenas nas esperanças da troca de governo. Não havia esteio concreto forte para sustentar esperanças. Ao contrário.
O desemprego aumentava, a população empregada diminuía. As taxas de juros "básicas" reais estavam praticamente nas mesmas alturas recessivas do restante do ano.
A inflação caía, mas ainda voava nas alturas em que costuma desanimar o povo. O estímulo já pequeno das exportações pareceu fraquejar. Houve acidentes pontuais em alguns setores produtivos. A política tinha surtos de baderna extra.
A confiança do consumidor, porém, voltou a aumentar neste janeiro, segundo dados da FGV do Rio. Antes de especular se "agora, vai", o índice subiu para quanto? Para um nível próximo apenas ao de agosto de 2015, quando o Brasil mergulhava ainda para as profundas da recessão.
Sim, estamos agora na direção inversa, mas conviria "confiar, desconfiando" nos índices de confiança, como diria o marechal-presidente Floriano Peixoto.
O índice de confiança é composto. Um de seus componentes, o de esperança, de melhorias daqui a seis meses, voltou a subir bem. O índice que reflete a situação econômica atual reage de modo muito modesta, quase no mesmo nível da depressão do início do ano passado.
Por fim, note-se que a última vez em que tais números estiveram na faixa de otimismo foi em outubro de 2014, eleição de Dilma Rousseff. Com o estelionato eleitoral e outros choques, começaram os colapsos.
Esse sorriso amarelo de animação vai resultar desta vez em algo diferente? "Especulativo, protesto", dir-se-ia em tribunal de filme americano. Mas é o que temos. O que temos para dar esteio a essa piscada de ânimo?
A inflação baixou bem no ano passado, da casa dos 11% para a dos 6%. Nesta faixa, ainda come muita renda e, a julgar por estatísticas, ainda desanima o povo. Neste ano, deve baixar até 4% ao ano, embora deva subir de novo, se as previsões de preços não estiverem outra vez muito erradas, como o foram no final do ano passado.
As taxas "básicas" de juros começaram a baixar de modo notável, pelo menos no mercado de dinheiro grosso, e vão baixar bem mais antes da metade do ano. Corte equivalente não vai chegar tão cedo no crediário, por assim dizer. Mas vai fazer em breve diferença para empresas. Mas é alguma coisa.
Embora desprezado pelo economista padrão, o dinheiro do saque das contas inativas do FGTS vai fazer alguma diferença. É cerca de 0,4% do PIB. Um Bolsa Família inteiro. Era um dinheiro inesperado que vai pingar.
Uma dúvida maior é a velocidade da destruição de empregos (além, claro, do tamanho da baderna política). Por ora, os chutes parecem pouco informados.
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