Índia da etnia baré ensina receitas e as bases de sua cozinha em novo livro
Tinha uma coisa que Josefa Antônia Gonçalves nunca imaginou que fosse acontecer. A publicação de um livro com a história de sua vida e a transcrição das "receitas da cozinha regional milenar" coletadas por mais de 50 anos e escritas por ela, com esferográfica, num caderno espiral.
Ainda não viu o livro e desconhecia até o título. "Qual é?", queria saber. Ouve, do outro lado da linha, que tem o nome dela estampado na capa, um dona Brazi escrito em maiúsculas, sobre uma foto dela em trajes de chef.
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Pesquisa cataloga tradições culinárias do alto Rio Negro
Solta um riso, sem esconder o orgulho. Conta como os últimos dias foram corridos. Anda às voltas com os preparativos para a viagem que fará a São Paulo na próxima semana. Vem para o lançamento do livro na quarta que vem (dia 30), no Tordesilhas.
À noite, ela e a chef Mara Salles farão um jantar no restaurante.
Veja receita de mujeca de filhote
A edição bilíngue traz um relato gostoso da jornalista Maria da Paz Trefaut sobre a cozinheira de origem baré que cativou Alex Atala. É do chef, aliás, o prefácio de "Dona Brazi: Cozinha Tradicional Amazônica" (editora Bei). Apresentado a ela pelo antropólogo Beto Ricardo, do Instituto Socioambiental (ISA), Atala escreve no prefácio como ficou deslumbrado por sua quinhampira e mujeca, ambos caldos de peixe -o primeiro com tucupi; o outro, engrossado com farinha de mandioca.
Mas foram as formigas, diz dona Brazi, que a tornaram conhecida fora de São Gabriel da Cachoeira (AM). "Aqui é que nem farinha, não pode faltar", diz. Trazendo sob o braço saúvas recendendo a capim-santo, ela já esteve em São Paulo duas vezes. Cozinhou no Tordesilhas e foi convidada até para ir a Paris. Mas disse não ao francês Pascal Barbot, chef do estrelado L'Astrance que se enamorou das saúvas. E de dona Brazi.
Rogério Assis/Divulgação | ||
Dona Brazi, um ícone da cozinha brasileira, do alto rio Negro |
Filha de um baré com uma índia da etnia tukano, dona Brazi nasceu numa comunidade na margem esquerda do rio Negro.
Antes de se mudar para a cidade, gostava de pegar a espingarda e se enfiar na mata atrás de cotias e tucanos. "Tacava tiro no que aparecia. Mas gosto mesmo é de tucano. Dá um caldinho bom."
Sabe que nem todas as receitas tradicionais da região podem ser feitas fora de lá pela falta de ingredientes. "Mas o peixe assado na folha de bananeira dá", diz. E seu famosos vinagrete de saúva, dona Brazi? "Ih, não dá. Meu marido diz que tô colocando o povo de São Paulo no mau caminho, ensinando vocês a comer formiga", diz, rindo.
PARA LER
Dona Brazi: Cozinha TRADICIONAL Amazônica
Autora Maria da Paz Trefaut (fotos de Rogério Assis)
Editora Bei
Quanto R$ 70; 256 págs. (edição bilíngue)
Cardápios do Brasil
Autora Ana Luiza Trajano
Editora Senac/SP
Quanto R$ 250; 331 págs. (edição trilíngue)
Comidas Tradicionais Indígenas do Alto Rio Negro
Autoras Luiza Garnelo e Gilda Barreto Baré
Editora Fiocruz/UFA
Quanto R$ 25; 112 págs., pelo site www.abrasco.org.br
PROGRAMAÇÃO
Jantar com Dona Brazi e Mara Salles
Quando dia 30, às 21h
Onde Tordesilhas (al. Tietê, 489, tel. 0/xx/11/3107-7444)
Quanto R$ 150 (menu com serviço e bebidas, exceto vinho); compra antecipada por telefone
Livraria da Folha
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